Reflexão sobre LOVE, DEATH + ROBOTS: Filosofando com Animações (Parte I)

Reflexão sobre LOVE, DEATH + ROBOTS: Filosofando com Animações (Parte I)

Olá, marujos! Hoje, faremos uma reflexão sobre a série de animações LOVE, DEATH + ROBOTS. Nessa série, temos episódios com histórias independentes que tratam ao menos um dos temas do título: Amor, Morte ou Robôs! A reflexão não terá um tema específico porque cada episódio tem a sua própria história e reflexão. Teremos spoilers de todos os episódios, então fiquem avisados. Vamos lá!

Sobre LOVE, DEATH + ROBOTS

LOVE, DEATH + ROBOTS é uma série de animação adulta lançada pela Netflix em 2019. A série é americana, foi criada por Tim Miller e produzida por ele e mais três pessoas: Joshua Donen, David Fincher e Jennifer Miller.

A primeira temporada (base desse artigo) contém dezoito episódios independentes, que variam entre seis e dezessete minutos. Cada episódio foi criado por uma equipe de produção diferente, espalhadas por vários países.

As histórias e estilos de animação são os mais variados possíveis, contendo, entretanto uma relação com ao menos um dos temas do título da série: amor, morte e/ou robôs.

Uma curiosidade sobre a forma como a Netflix disponibilizou a série é que os episódios são exibidos de forma aleatória para cada pessoa que vê. Dessa forma, não existe uma ordem oficial. Cada pessoa verá os episódios em uma ordem específica (mas isso não interfere em nada a apreciação da série, já que são episódios com histórias independentes).

Reflexão sobre LOVE, DEATH + ROBOTS (COM Spoilers)

Sonnie’s Edge (A Vantagem de Sonnie): Estupro, Machismo e Vingança

Nesse episódio, presenciamos uma luta clandestina de dois grandes monstros os quais são controlados por pessoas. É dito que Sonnie, a pessoa que controla o monstro Khanivore, sofreu violência sexual e agora busca vingança. Ela vence e descobrimos que ela ganhou da pessoa que a estuprou. Nos bastidores, a amante do estuprador mata Sonnie. Porém, é revelado que o corpo humano na verdade era uma bioengenharia e que a consciência de Sonnie estava no monstro. O monstro desperta e tem a sua vingança.

Esse episódio nos leva a refletir sobre as marcas deixadas pelo estupro em uma mulher. A humilhação que ela passa, a violência física e psicológica sofrida são marcas que nunca mais serão apagadas. Em muitos casos, o acontecimento é tão marcante que vai guiar toda a vida futura daquela pessoa.

Outra questão interessante é pensar porque a amante do estuprador aceitou a missão de matar Sonnie. Onde está o apoio feminino? Como pode uma mulher aceitar estar com um cara que fez uma barbárie dessas e não se arrepende? Pior, como ela pode ser conivente com um segundo crime? Esses casos são reais e acabam mostrando como as mulheres ainda precisam se unir mais para lutar contra o machismo. Muitas nem percebem que estão tão impregnadas pelo machismo que acabam defendendo o discurso de que a culpa do estupro sempre é da mulher.

Por fim, temos a vingança de Sonnie. Sua frase final “Você está com medo agora?” é uma catarse para o expectador que quer vingança pelos sofrimentos passados por Sonnie. Porém, não podemos deixar nosso instinto nos guiar e precisamos pensar se esse é o caminho correto de ação. Por mais que queiramos uma compensação, devolver a violência com violência nunca pode ser a solução.

Three Robots (Os Três Robôs): Uma Questão de Sentido e Significado

Nesse episódio, acompanhamos a exploração de três robôs a uma Terra que um dia foi habitada por humanos. Durante o episódio, eles vão encontrando vários itens e locais que nós humanos utilizávamos e eles vão tentando criar um sentido e um significado para tudo aquilo. No meio do episódio eles encontram um gatinho vivo e descobrem que os gatos passaram por uma modificação genética que os permitiu sobreviver.

A reflexão que temos sobre esse episódio é olhar para nossas práticas e nossos hábitos com um olhar distante, de alguém que não vive dessa forma e ver o quanto algumas coisas são ridículas ou bobas. É pensar na graça que tem em pegar uma bola e ficar quicando-a e jogando-a em um buraco (basquete). É perceber como criamos os shoppings centers como grande monumentos do consumismo.

Nós costumamos olhar olhar para povos do passado e achar graça ou, ao menos sem sentido, gastar tempo, esforço e dinheiro na construção de pirâmides gigantes apenas para enterrar uma pessoa. Mas fazer uma construção gigante só para encher de lojas que vendem praticamente a mesma coisa não nos é estranho. 

A piada do “gatinhos explosivos” (Exploding Kittens) é bem interessante. O termo ficou famoso, pelo menos nos EUA, por causa de um jogo de cartas que é bem popular lá. Os três robôs conheciam o termo, mas não sabiam a que ele se referia. Quando eles viram o gatinho, achavam que ele poderia explodir a qualquer momento. Essa piada nos faz pensar na questão do signo, significado e significante (um tema da filosofia da linguagem): uma palavra / termo / código / gesto pode significar muitas coisas e depende dos seus interlocutores a interpretação deles. Dessa forma, é preciso saber o contexto para fazer uma correta interpretação do signo.

The Witness (A Testemunha): Precipitação e Ciclo de Ódio

Nesse episódio, um homem percebe que acabou de matar uma mulher. Quando ele olha pela janela, vê que uma mulher idêntica a que ele matou testemunhou o crime. Desesperado e desnorteado com o que está acontecendo, ele vai atrás da mulher. Ela, por sua vez, achando que vai ser a próxima vítima, foge. Começa uma perseguição. Em certo momento, a mulher pega uma arma e se esconde em um apartamento. O homem entra tentando conversar com ela, mas ocorre um desentendimento e ela o mata. Quando ela olha pela janela, um homem igual ao que ela matou testemunhou o assassinato.

Compreendemos perfeitamente porque a mulher fugiu. Sem o devido contexto, parecia óbvio que o homem tinha assassinado alguém e que vinha atrás dela. Porém, as aparências enganam. Ela fora precipitada em tirar uma conclusão e isso criou toda a confusão da história. Descartes dirá que um dos maiores erros do cientista é se precipitar, aceitando logo uma teoria sem a investigar devidamente. É isso que ocorre aqui. E podemos pensar em todas as vezes em que, devido a nossa precipitação, nosso julgamento antecipado, cometemos um erro.

Curiosamente, toda a atitude da mulher culminou em uma história cíclica, em que ela passou de vítima à algoz. Podemos refletir sobre os vários casos em que vítimas de crimes acabam se tornando, no futuro, criminosas desses mesmos crimes aos quais elas sofreram. No episódio, faz parecer que o motivo foi “sem querer”. O crime foi uma reação. Pode ser isso na vida real também: a única reação possível de quem sofre violência é reagir com violência. 

Suits (Proteção contra Alienígenas): Quem é o Invasor?

Nesse episódio, vemos um grupo de fazendeiros sendo atacados por monstros que possuem uma forma de insetos gigantes. As barreiras automáticas dos humanos falham e eles precisam lutar. Para isso, usam armaduras gigantes, se tornando enormes robôs combatentes. No final, eles conseguem impedir a invasão. Quando a câmera se afasta do local, vemos que é um planeta diferente da Terra, cheio de colônias humanas e que os habitantes originais eram esses “insetóides”.

Nesse episódio, temos um plot twist (uma grande mudança de perspectiva no roteiro). Se no começo estávamos solidários aos humanos que estariam se protegendo, depois descobrimos que eles são os invasores, e que os insetos só queriam suas terras de volta.

Refletindo, podemos perceber que essa atitude é a marca da humanidade. Nós nos recusamos a integrar a natureza, nós a destruímos e a subjugamos para atender as nossas vontades. Depois, quando ocorrem desastres naturais, invasões de bichos em nossas casas ou pandemias, queremos culpar a natureza, sendo que todo esse descontrole foi causado por nós mesmos, quando nos recusamos a viver em comunhão com os demais seres vivos, integrando-nos ao meio ambiente, e nos achamos superiores demais.

Sucker of Souls (Sugador de Almas): O Poder dos Mais Fracos

Nesse episódio, acompanhamos um grupo de exploradores de tumbas. O grupo está sendo perseguido por um monstro poderoso que mata e suga a energia vital / sangue / fluidos da vítima.  Eles identificam o monstro como sendo Drácula. Depois de muita dificuldade, eles conseguem escapar de Drácula. Porém, acabam entrando em uma espécie de ninho de vampiros.

Quem salvou o grupo do ataque de Drácula foi um gatinho! Em certo momento, quando o grupo estava encurralado, Drácula iria acabar com eles. Mas um gatinho assustou Drácula e ele fugiu, dando tempo para o grupo se reorganizar. Diz a lenda que Drácula tinha medo de gatos e que gatos são capazes de sentir e proteger seus donos de espíritos e seres malignos. Lenda ou não, é interessante pensar como um bichinho tecnicamente fraco, frágil e inofensivo consegue assustar um monstro todo poderoso. Isso nos faz refletir sobre o poder dos mais fracos, que ninguém é totalmente inútil e que podemos encarar problemas maiores do que nós.

Às vezes, a questão está no medo que sentimos dos nossos desafios. Quando os encaramos com naturalidade, percebemos que somos capazes de vencer. O gatinho não estava entendendo nada quando foi usado como arma e mesmo assim “venceu”. Se nós agirmos de forma mais natural diante das dificuldades da vida, talvez consigamos melhores resultados do que simplesmente fugir desesperadamente. 

Reflexão sobre LOVE, DEATH + ROBOTS: Conclusão

Chegamos ao fim da primeira parte dessa reflexão sobre LOVE, DEATH + ROBOTS. Analisamos, até aqui, cinco episódios. Continuaremos as reflexões dos demais episódios na Parte II e Parte III. Espero que tenham gostado de ver as enormes possibilidades desses pequenos filmes, que além de serem visualmente excelentes também nos levam a pensar bastante.

E aí? Qual desses cinco episódios você gosta mais? Comenta! Conhece algum fã dessa animação? Compartilha essa reflexão sobre LOVE, DEATH + ROBOTS com ele! Quer sugerir outras séries cyberpunk para reflexão nerd? Entra em contato e me diz quais!

Até a próxima e tenham uma boa viagem!

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Professor de filosofia desde 2014 e nerd desde sempre. Tem como objetivo pessoal mostrar às pessoas que filosofia é importante e não é uma coisa chata. Gosta de falar dos temas filosóficos de forma descontraída e atual, fazendo muitas referências ao universo nerd.