Falseabilidade Descomplicada: Karl Popper e o Falsificacionismo

Falseabilidade Descomplicada: Karl Popper e o Falsificacionismo

Olá, marujos! Hoje explicaremos o princípio da falseabilidade de uma forma descomplicada. Esse princípio foi introduzido pelo filósofo Karl Popper para explicar a forma como se compreende a ciência e seus resultados. Dessa forma, esse princípio pertence ao campo da Epistemologia / Filosofia da Ciência. A partir desse princípio, fundou-se uma corrente filosófica denominada falsificacionismo. Vamos explicar tudo isso com uma linguagem simples e exemplos, junto com uma breve biografia do autor. Vamos lá!

Sobre Karl Popper

Karl Raimund Popper nasceu em 28 de julho de 1902 na cidade de Viena, Áustria (na época, Áustria-Hungria). Ele era de uma família classe média alta. Tinham descendência judia, mas praticavam o luteranismo.

Ele abandonou o que seria o nosso ensino médio aos 16 anos e foi para a Universidade de Viena frequentar aulas livres de diversos temas que lhe interessavam, tais como matemática, filosofia, física e psicologia. Só em 1922, já com 20 anos, que ele fez uma prova especial (que corresponderia ao nosso atual ENCCEJA) e conseguiu se formar no ensino médio, ingressando na Universidade de Viena agora como aluno formal. Em 1928, ele conquistou um doutorado em psicologia.

Com a ascensão do nazismo, ele começou a escrever um livro para conseguir uma posição acadêmica em algum país seguro para judeus. Em 1934 ele publica um material resumido que já apresenta sua tese da falseabilidade. Em 1935 ele tira uma licença sem vencimento e vai para o Reino Unido a estudo. Em 1937 ele consegue uma vaga de professor de filosofia na Universidade da Nova Zelândia. Após a segunda guerra mundial, ele retorna ao Reino Unido para seguir uma carreira acadêmica.

Ele se aposentou da vida acadêmica em 1969, mas continuo intelectualmente ativo até a morte. Ele faleceu no dia 17 de setembro de 1994 na cidade de Londres, Inglaterra. Ele foi cremado e suas cinzas depositadas em Viena, junto de sua esposa (que já havia morrido em 1985).

Falseabilidade Descomplicada: Crítica ao Critério de Verificabilidade

Antes de propor seu princípio da falseabilidade, Popper vai criticar o critério de verificabilidade do Círculo de Viena, que era a proposta epistemológica válida na época (ou seja, o critério de verificabilidade era o princípio aceito para dizer o que é ciência e como produzir os conhecimentos científicos).

O Círculo de Viena defendia que a ciência deveria se fundamentar na indução, ou seja, nas experiências como ponto de partida. Do resultado positivo dessas experiências, poder-se-ia criar uma lei universal (uma lei científica). O problema, segundo Popper, é que é impossível fazer todas as experiências necessárias para comprovar uma lei que se proponha universal.

Ele utiliza um exemplo muito simples que é mais ou menos assim: por mais que eu veja durante toda minha vida apenas cisnes brancos, isso não me permite dizer que todos os cisnes são brancos porque pode acontecer de existir algum cisne negro por aí que eu nunca vi! Ou seja, por mais que eu faça diversas experiências científicas, a minha teoria nunca será perfeita porque é impossível fazer todos os testes científicos imagináveis.

Pensem, por exemplo, na criação de um medicamento. Por mais que eu teste em um milhão de pacientes esse remédio e ele funcione, isso não quer dizer que ele é 100% eficaz e que sempre vai funcionar porque cada organismo é de um jeito e existem inimagináveis interações possíveis, seja com outros medicamentos ou com outras substâncias que possam estar presentes no corpo de uma pessoa. Dessa forma, seguindo o critério da verificabilidade, seria impossível lançar esse medicamento porque ele nunca estaria perfeitamente testado.

Falseabilidade Descomplicada: Método Hipotético-dedutivo

A grande sacada de Popper foi perceber que todas as leis científicas começam com uma hipótese, com uma ideia. E é a partir dessa hipótese que se começam os testes que verificam e “comprovam” a hipótese. Logo, a origem do conhecimento científico não é a experiência (como defendia o Círculo de Viena), mas a hipótese. Seguindo essa linha de pensamento, o conhecimento científico não começa com uma indução (de experiências particulares para uma explicação universal), mas sim com uma dedução (de uma explicação universal, testa-se o seu funcionamento em casos particulares, através de experiências). Ele chama esse método de hipotético-dedutivo.

É nesse momento que entra o princípio de falseabilidade (ou refutabilidade). A tarefa do cientista não seria fazer vários experimentos para poder formular uma lei universal. Ao contrário, primeiro ele formularia a hipótese e depois faria uma série de experimentos para tentar falsear essa hipótese, ou seja, testá-la para ver se ela falha.

Para Popper, nunca se pode comprovar que uma hipótese é irrefutável, mas pode-se comprovar que ela é extremamente resiste a falhas. Nesse caso, a proposta do cientista se torna mais aceita quanto mais se prova que ela não falha nos testes. Cada vez que um experimento o qual tenta provar que a hipótese está errada falha, ele acaba corroborando a “verdade” daquela hipótese.

Usando os exemplos dados anteriormente, podemos pensar agora dessa forma:

Por nunca ter visto um cisne negro, eu crio a hipótese que todos os cisnes são brancos. Agora, essa minha hipótese funcionará como “verdade” até que alguém me mostre um cisne negro. Quanto mais tempo for demorando para isso ocorrer, mais “confirmada” vai ficando minha hipótese. Contudo, ela deixará de valer no instante em que alguém me mostrar o cisne negro.

Com relação ao medicamento, o cientista partiu da hipótese que um determinado remédio cura uma determinada doença. Ele testa um número considerável de vezes esse remédio com um número considerável de variabilidade. Depois que o remédio se apresenta eficaz em uma proporção significativa, 99% por exemplo, ele é encaminhado para comercialização. Aí, na bula, especifica-se as chances de ele funcionar e como isso pode ser afetado dependendo de quem toma e nas condições que o toma. O remédio funciona? Funciona! Ele é infalível? Não! Mas isso o impede de ser comercializado? Também não!

Falseabilidade Descomplicada: Novo Conceito de Ciência

Eu coloquei verdade com aspas no tópico anterior porque a partir desse momento não existe mais a noção de verdade absoluta na ciência. A ciência não conseguiria encontrar verdades definitivas sobre a natureza, mas conseguiria encontrar hipóteses muito bem elaboradas que se aproximariam muito de verdades, mas lembrando que a qualquer momento ela poderia ser refutada com o surgimento de um novo experimento que comprovasse que aquela hipótese não funciona. 

É por isso que agora a ciência evita usar o termo lei universal para suas ideias, preferindo o termo teoria científica. Teoria científica seria um conjunto de hipóteses que se prova muito resistente a tentativas de falseabilidade.

Assim, Popper mudou a forma de enxergar o saber científico tal como foi concebido desde o positivismo. O conhecimento científico não é mais aquele que é verificável por experimentos técnicos, mas aquele conhecimento que pode ser testado e refutado. A ciência agora trabalha com probabilidades e não certezas.

A Ciência, a partir de Popper, é uma forma de conhecimento que ganha mais confiabilidade quanto mais não se consegue mostrar um erro em determinada teoria. Logo, só é científica uma teoria que possa ser falseada, refutada.

Uma teoria sobre existência ou não de vida extraterrestre é científica porque se pode atualmente fazer experiências que provam que não existe vida extraterrestre, assim como existe abertura para experimentos que venham a provar a existência de vida extraterrestre (quem sabe no futuro, com novas tecnologias e novos acessos ao universo). Por outro lado, não é científica uma teoria que prova ou não a existência da alma humana, porque não tem como refutar essas hipóteses já que não existe nenhum método capaz de testar isso, seja para provar ou para negar.

Falseabilidade Descomplicada: Conclusão

Atualmente, o conceito de ciência como conhecimento falseável é o mais aceito. Os cientistas admitiram que é impossível encontrar as verdades do universo, mas estão conscientes que possuem a missão de perseguir essas verdades. Quanto mais eles buscam, mais eles descobrem, mais eles abandonam velhas teorias e criam novas que ensejarão novas pesquisas e assim sucessivamente. A ciência é uma busca sem fim e isso não é ruim.

Lista de Leitura (Aprofundamento em Karl Popper e o Falsificacionismo)

Caso queiram aprofundar seus estudos em Karl Popper e o Falsificacionismo, segue uma sugestão de lista de leitura:

A Lógica da Pesquisa Científica (Karl Popper)

Os dois problemas fundamentais da teoria do conhecimento (Karl Popper)

Conjeturas e Refutações (Karl Popper)

Popper: Textos Escolhidos (Karl Popper)

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Falseabilidade Descomplicada: Referências

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Filosofando: introdução à filosofia. São Paulo: Moderna, 2016.

Coleção Ensino Fundamental 9° ano: Volume 2 – Belo Horizonte: Bernoulli Sistema de Ensino, 2020. 70 p.: il.

Wikipédia (verbetes Lei científica e Teoria científica)

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Professor de filosofia desde 2014 e nerd desde sempre. Tem como objetivo pessoal mostrar às pessoas que filosofia é importante e não é uma coisa chata. Gosta de falar dos temas filosóficos de forma descontraída e atual, fazendo muitas referências ao universo nerd.