Reflexão sobre Doutor Estranho no Multiverso da Loucura: Você é Feliz?

Reflexão sobre Doutor Estranho no Multiverso da Loucura: Você é Feliz?

Olá, marujos! Hoje, faremos uma reflexão sobre o filme Doutor Estranho no Multiverso da Loucura. Nesse filme, acompanharemos o mago Stephen Strange viajando por vários multiversos para resolver um grande problema. Na reflexão, trabalharei dois temas apresentados no filme: a busca incessante pela felicidade e a soberba de acharmos que podemos tudo. Teremos spoilers de toda a trama do filme. Vamos lá!

Sobre Doutor Estranho no Multiverso da Loucura (COM Spoilers)

Doutor Estranho no Multiverso da Loucura estreou em 2022 nos cinemas e provavelmente chegará no Disney+ no mesmo ano. Esse pode ser considerado o segundo filme do mago e dá um prosseguimento sutil no MCU (Universo Cinematográfico da Marvel em inglês).

A história começa com o casamento da Dra. Christine Palmer (Rachel McAdams) com outra pessoa que não o nosso Stephen Strange (Benedict Cumberbatch). Durante a festa, um tumulto começa nas ruas de Nova Iorque e o mago deixa o casamento para ver o que está acontecendo.

Nas ruas, surge um monstro gigante chamado Gargantos (que, na verdade, é Shuma-Gorath com outro nome por causa de direitos autorais) lutando contra uma adolescente chamada America Chavez (Xochitl Gomez). Após lutarem juntos para derrotar o monstro, America explica que possui o poder de viajar entre universos e está sendo perseguida por uma força poderosíssima que quer absorver seus poderes. Nisso, Wong (Benedict Wong) explica que o monstro estava sendo controlado por magia.

Doutor Estranho, então, vai até Wanda Maximoff (Elizabeth Olsen) pedir ajuda para descobrir quem seria esse poderoso usuário de magia. Lá, ele acaba descobrindo que é a própria Feiticeira Escarlate, que quer o poder de America para viajar até outro universo e reencontrar seus filhos. Na mesma ocasião, a bruxa dá um ultimato para o mago entregar a menina e evitar uma guerra.

Strange recusa a chantagem e transforma o Kamar-Taj em uma fortaleza, mas não adianta muito e a Feiticeira rapidamente penetra as proteções. Quando a maga está quase conseguindo capturar Chavez, a adolescente abre um portal e viaja junto com o Doutor Estranho pelo multiverso.

Através do poder do Darkhold, a Feiticeira Escarlate transporta a sua consciência através do multiverso e começa uma caçada à adolescente e ao mago. Ao mesmo tempo America e Strange buscam ajuda com suas variantes, para achar um meio de derrotar Wanda.

No final, percebe-se que a única pessoa que pode deter a Feiticeira é a própria feiticeira. Para isso, America mostra para a Feiticeira como ela se tornou má e cruel, de tal forma que seus próprios filhos de outro universo a temem e a rejeitam como mãe. Dessa forma, Wanda cai em si e resolve se sacrificar para acabar com todo o mal causado pelo Darkhold, que a tinha contaminado com sua magia negra.

Reflexão sobre Doutor Estranho no Multiverso da Loucura: Todos só Querem ser Felizes

O tema da felicidade aparece no filme logo no seu começo, durante o casamento de Christine Palmer. Em um diálogo entre o mago e sua ex-namorada, ambos se perguntam se estão felizes. Christine responde que está feliz, logo depois de dizer que nunca amou verdadeiramente Strange por causa de seu jeito. Já Strange, claramente mente dizendo que está feliz (já que ele amou Christine, mas não ficou com ela porque preferiu assumir sua responsabilidade como mago supremo até a vinda de Thanos).

Depois, o tema da felicidade reaparece com Wanda revelando sua intenção de viajar até outro universo usando os poderes de America Chavez e, com isso, “reencontrar” seus filhos. Para ela, ela já perdeu tudo (pais, irmão, companheiro e os filhos daquele universo) e merece a felicidade de ao menos estar com seus filhos novamente, mesmo sendo de outro universo (para entender melhor o drama da Wanda, é importante ver a série WandaVision ou ler a reflexão que fiz sobre ela).

A personagem America Chavez também não está feliz pois se sente culpada por ter aberto o portal multiversal sem querer e jogado suas mães em algum lugar desconhecido. Para ela, a felicidade só retornará quando conseguir encontrar suas mães e saber que elas estão bem.

Como vocês já sabem, o filme todo é uma perseguição. Podemos dizer que, metaforicamente, a Feiticeira Escarlate está todo o filme perseguindo seu ideal de felicidade. E essa atitude de Wanda não nos é estranha porque todos nós também perseguimos a felicidade.

Aristóteles concluíra que o fim último de nossas ações é a felicidade. Dessa forma, tudo o que fazemos tem como objetivo último sermos felizes. Por isso, a grande questão para ele era entender o que é a felicidade.

Da mesma forma, Santo Agostinho concluíra que todos os seres humanos possuem em sua mente a verdade inata de que queremos ser felizes. E, por causa disso, nós vivemos buscando a felicidade. O problema, para ele, é que cada um entende de modo diferente o que é a felicidade.

Outro filósofo que trouxe o tema da felicidade foi Jeremy Bentham. Sua ética utilitarista se baseia no princípio da felicidade que, para ele, era a busca pelo prazer e fuga da dor.

Podemos dizer que a Feiticeira Escarlate concluiu que aquilo que lhe daria prazer ou diminuiria sua dor seria ter seus filhos novamente. Quem é mãe com certeza entende que o amor que se tem pelos filhos supera o amor pelo marido, irmãos e/ou pais. É por isso que seu foco é exclusivo nas crianças, ignorando completamente outras possibilidades que ela poderia concretizar.

O problema, obviamente, é que sua busca pela felicidade foi egoísta. Mesmo que os filósofos helênicos entendessem que a felicidade poderia ser encontrada de forma individual, ela deveria ser um direito de todos. E não foi isso que Wanda fez. Ela estava disposta a sacrificar a felicidade de qualquer um para ter a sua felicidade atendida, até mesmo de suas versões de outros universos (já que ela não hesitou em possuir e machucar a Wanda da Terra-838).

Enquanto nos desesperamos com a busca insana por felicidade da Wanda, acompanhamos o Doutor Estranho compreendendo que ele também chegou à insanidade em alguns universos. Na Terra-838, seu desespero em derrotar Thanos o fez destruir um outro universo inteiro. Em mais outro universo, o mago também ficou insano ao buscar sem sucesso um universo em que seria feliz com Christine.

Dessa forma, o nosso Doutor Estranho não é tão diferente da Wanda. Talvez, só não tinha dado tempo para ele enlouquecer. Como a “versão maligna” dele disse, tudo começou após o mago voltar para casa no final da festa de casamento da Christine. No nosso universo, na Terra-616, isso não chegou a acontecer porque a America Chavez apareceu no meio da festa!

Sendo assim, podemos dizer que quem controlou os impulsos naturais do próprio mago em buscar a felicidade de modos equivocados foi ele ter visto o que aconteceu com a Feiticeira. Da mesma forma que a própria Feiticeira se reconheceu como um monstro após a reação dos seus filhos da Terra-838, Strange reconheceu na Wanda o monstro que se tornaria se continuasse alimentando sua obsessão por Christine, como se ela fosse a única forma dele ser feliz.

Reflexão sobre Doutor Estranho no Multiverso da Loucura: Encontrando a Felicidade

Ok. Está claro que a solução para a Wanda não é ter seus filhos e a solução para o Doutor Estranho não é ter a Christine. Mas como eles poderiam ser felizes sem seus amores? O filme nos apresenta duas respostas que também aparecem na filosofia.

A primeira resposta é dada por Wong. Questionado por Strange se era feliz, Wong disse que é grato pela vida que tem. Em outras palavras, podemos dizer que, para ele, a felicidade está em viver o momento e aceitar as vicissitudes que a vida lhe proporciona (tanto as coisas boas, quanto as ruins).

É natural ele pensar dessa forma já que ele sempre demonstrou seriedade na preservação da ordem natural das coisas, criticando constantemente o próprio Strange quando este quebrava as leis da natureza com a joia do tempo.

O que talvez vocês não saibam, é que esse pensamento já era defendido pelos filósofos estoicos. Os quais, em sua ética, diziam que a felicidade está em aceitar o destino porque tudo faz parte de um macrocosmo e somos partes de um todo ordenado e lógico.

A segunda resposta foi dada de forma mais sutil pelo Doutor Estranho. Pouco antes de reverenciar o mago supremo, ele diz que não precisamos passar pelas dificuldades da vida sozinhos. Em outras palavras, o que ele nos diz é que um dos caminhos para a felicidade é a amizade.

Strange sofreu porque perdeu sua amada. Wanda sofreu porque perdeu seus filhos. America sofreu porque perdeu suas mães. Mas todos eles têm amigos que lhes ajudam a superar essas perdas e trazer alento para suas vidas. Perder pessoas que amamos é normal e a amizade é uma das formas mais eficazes de superar a perda de algo importante para nós. A amizade nos lembra que existem outras pessoas importantes em nossas vidas, que nos complementam e que nos amam.

Um dos grandes defensores da amizade como caminho para a felicidade foi Epicuro. Em sua ética, defendia que a felicidade era encontrada na fruição adequada dos prazeres e um desses prazeres recomendados era exatamente a amizade verdadeira.

Reflexão sobre Doutor Estranho no Multiverso da Loucura: Nós Não Podemos Tudo

Wanda achava que tinha o direito de entrar no multiverso para voltar a ser mãe dos seus filhos não importasse as consequências. Doutor Estranho achava que tinha a obrigação de salvar o mundo a qualquer custo e também achava que tinha o direito de ser feliz com Christine. America Chavez achava que tinha a obrigação de encontrar e salvar suas mães.

Esses exemplos do filme refletem algo muito forte em nós: a soberba de acharmos que podemos tudo ou que tudo depende de nós para se resolver. Mas não é assim que a vida funciona…

Wanda percebeu que não pode mais ter seus filhos de volta. Estranho percebeu que o mundo pode ser salvo por outras pessoas e que não está destinado a ficar com Christine. America percebeu que é melhor se fixar em um lugar e esperar uma possível oportunidade de encontrar suas mães sem ficar se culpando.

Da mesma forma, nós precisamos perceber que não podemos resolver todos os problemas que nos aparecem, muito menos da forma que gostaríamos. Além disso, também não somos seres indispensáveis para o mundo, como se fôssemos essenciais para que tudo ocorra bem.

Conclusão

Retomando o estoicismo, não devemos nos esforçar para que as coisas aconteçam do jeito que queremos, mas devemos nos esforçar para aceitarmos a forma como as coisas acontecem. É nisso que a felicidade se encontra e, se tivermos amigos que nos apoiam, passaremos pelos acontecimentos da vida de forma mais tranquila.

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Até a próxima e tenham uma boa viagem!

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Professor de filosofia desde 2014 e nerd desde sempre. Tem como objetivo pessoal mostrar às pessoas que filosofia é importante e não é uma coisa chata. Gosta de falar dos temas filosóficos de forma descontraída e atual, fazendo muitas referências ao universo nerd.