Imperativo Categórico Descomplicado

Imperativo Categórico Descomplicado: Ética de Immanuel Kant

Imperativo Categórico Descomplicado

Olá, marujos! Hoje iremos ver o conceito Imperativo Categórico de Kant de um jeito descomplicado. Para isso, iremos explicar com uma linguagem simples e com exemplos a teoria desse filósofo. Também iremos fazer um breve resumo sobre Kant e como ele chegou até esse pensamento. Vamos lá!

Immanuel Kant

Kant (1724-1804) foi um filósofo austríaco. Sua teoria é considerada o ápice do pensamento filosófico moderno. Desenvolveu um enorme trabalho através de um sistema filosófico próprio, que foi compilado nas suas críticas: Crítica da Razão Pura, Crítica da Razão Prática e Crítica do Juízo. Para mais informações sobre ele, podem acessar esse artigo.

Imperativo Categórico Descomplicado: Antropocentrismo e Autonomia do Sujeito Humano

Uma palavra central do pensamento moderno é o antropocentrismo. Essa perspectiva defende que o ser humano deve ser considerado o centro do universo, ou seja, o responsável por tudo e objetivo final de tudo o que é feito. Dessa forma, o ser humano não é só mais um ser da natureza e também não é mais uma criatura de Deus, mas é um ser autônomo.

Sendo um ser autônomo, as leis morais, as regras de convivência, as escolhas do que é bom e o que é ruim para o indivíduo serão estabelecidas pelo próprio sujeito, através da sua razão. A razão é a característica determinante que distingue o ser humano de tudo o que existe.

Por outro lado, subjetividade não significa individualidade. Dessa forma, a razão cria uma lei moral que obriga o ser humano a agir de uma determinada forma. Essa obrigação garante que a sua ação não será egoísta nem movida por interesses particulares, mas sim reta. Assim, a ação de um indivíduo sempre irá respeita a autonomia do outro, evitando-se o conflito.

Resumindo: a razão humana é aquela que cria a lei moral. Essa lei moral garante a liberdade do ser humano, pois ele age pela sua vontade. Entretanto, esse agir não é individualista. A ação humana é coletiva, respeitando a liberdade do outro e a dignidade de todos os seres humanos.

Imperativo Categórico Descomplicado

Kant desenvolveu um conceito que ele chamou de Imperativo Categórico para expor a forma como a razão humana obriga o sujeito a agir. Da mesma forma, demostra o dever do sujeito em obedecer a lei moral estipulada pela razão. Somente assim, segundo o filósofo, agiríamos livremente e de forma digna.

A teoria do Imperativo Categórico é explicada através de três regras de conduta. Para Kant, só estaremos agindo eticamente quando cumprirmos concomitantemente as três regras. Ou seja, não adianta fazer uma coisa e não fazer a outra. Não adianta seguir uma ou duas e ignorar outra. Somente estaremos agindo corretamente quando respeitarmos as três regras ao mesmo tempo.

Sendo assim, antes de agir, devemos considerar cada uma das três regras, como se fosse um check list. Se passar nas três, é uma ação moral. Se ficar pendente em alguma, não é moral.

I. Lei Universal

Age como se a máxima de tua ação devesse tornar-se, através da tua vontade, uma lei universal” ou “Age como se a máxima da tua ação fosse para ser transformada, através da tua vontade, em uma lei universal da natureza”.

A primeira regra kantiana diz que, ao agirmos, devemos pensar antes se aquilo que iremos fazer pode ser feito por qualquer pessoa e isso não causaria problemas. Se a ação for sobre alguma outra pessoa ou envolver outra pessoa, também temos que julgar se gostaríamos de estar no lugar da outra pessoa.

Essa regra se aproxima muito do ditado popular “não faça ao outro o que você não gostaria que fizessem a você”. Dessa forma, Kant nos quer mostrar que a nossa ação deve ser antecedida por um julgamento racional: “aquilo que estou fazendo pode ser feito por qualquer pessoa sem nenhum problema? Eu gostaria de estar no lugar da outra pessoa que vai sofrer a ação?”. Se a resposta for “sim”, a ação passou pela primeira avaliação e seguimos para a segunda; se não passou, já sabemos que não é moral.

II. Fim em Si Mesmo

Age de tal forma que uses a humanidade, tanto na tua pessoa, como na pessoa de qualquer outro, sempre e ao mesmo tempo como fim e nunca simplesmente como meio“.

A segunda regra kantiana diz que, ao agirmos, devemos considerar a dignidade do ser humano. Não só a dos outros, quanto a nossa própria. Por isso, devemos considerar o ser humano como um fim em si mesmo e não um meio para se conseguir algo.

Isso quer dizer que, antes de agirmos, devemos pensar: “o que estou fazendo fere a minha dignidade ou dignidade de outra pessoa? O que estou fazendo me coloca ou coloca outro em situação humilhante?”. Se a resposta for “não”, a ação passou pela segunda avaliação e seguimos para a terceira; se não passou, já sabemos que não é moral.

III. Legislador Universal (ou da Autonomia)

Age de tal maneira que tua vontade possa encarar a si mesma, ao mesmo tempo, como um legislador universal através de suas máximas” ou “Age como se fosses, através de suas máximas, sempre um membro legislador no reino universal dos fins”.

A terceira regra kantiana diz que, ao agirmos, devemos julgar as nossas ações como se elas não fossem necessariamente nossas. A proposta aqui é saber se, em uma espécie de tribunal, se tivéssemos que julgar a ação em questão, nós consideraríamos ela correta ou incorreta.

Isso quer dizer que, antes de agirmos, devemos pensar: “Se eu visse alguém fazendo isso, acharia certo?”. Se a resposta for “sim”, a ação passou pela terceira avaliação e podemos dizer que é uma ação moral; se não passou, então não é moral.

Imperativo Categórico Descomplicado: Trabalhando com Exemplos

Vamos agora tentar criar situações hipotéticas para serem avaliadas pelo Imperativo Categórico kantiano. Pode ser que algumas delas sejam um pouco extremistas, mas é apenas para facilitar o entendimento.

Exemplo A:

Encontro uma carteira com dinheiro e documentos. Estou precisando de dinheiro para comprar remédio para minha mãe doente. Devo ou não pegar o dinheiro?

Avaliando essa situação, nos deparamos com a primeira regra, que nos faz questionar se gostaríamos que aquilo que iremos fazer poderia ser feito também conosco.

Por mais que exista o ditado popular “achado não é roubado”, nós gostaríamos de ter a nossa carteira devolvida de forma intacta caso a perdêssemos. Logo, não gostaríamos que alguém pegasse nosso dinheiro caso encontrasse nossa carteira, independentemente do motivo.

Dessa forma, no exemplo A, a ação de ficar com o dinheiro seria considerada errada pela regra I. Sendo assim, nem precisamos segui para as demais regras.

Exemplo B:

Estou em uma festa e a  pessoa com que sempre quis transar está me dando mole. Acontece que ela está muito bêbada e não tenho certeza se ela está consciente do que está fazendo. Devo ou não transar com ela?

Aqui temos uma situação muito interessante. Para algumas pessoas, essa situação já seria considerada errada pela regra I. Entretanto, tem pessoas que diriam que ela passaria. O argumento normalmente é “ela aceitou a situação no momento em que se embriagou” (seria a expressão do dito popular, e me perdoem pelo termo, “cu de bêbado não tem dono”) ou “eu não me incomodaria de transar bêbado(a)”. Esses argumentos serviriam para justificar uma possível “lei universal” da referida ação.

Entretanto, mesmo passando pela primeira regra, a ação seria descartada pela segunda regra. A segunda regra fala da dignidade do ser humano. Ter relações sexuais com alguém que não está plenamente consciente do que está fazendo é desrespeitar aquela pessoa. Mesmo que você não ache errado, a regra moral diz que TODOS os seres humanos devem ser considerados como fins em si mesmo, e não como meios para se obter alguma vantagem.

Dessa forma, no exemplo B, a ação de transar com uma pessoa bêbada seria considerada errada pela regra II. Sendo assim, nem precisamos segui para a terceira regra.

Exemplo C:

Estou no meio de um bloco de carnaval. Estou muito apertado para fazer xixi e não tem nenhum banheiro público à vista. Posso ou não fazer xixi atrás do poste?

Bom, pensando em nossa ação como lei universal, podemos facilmente julgar que não existe problema em alguém muito apertado fazer xixi na rua, contanto que não se exponha. Da mesma forma, essa atitude não fere a dignidade de ninguém já que nem a pessoa que urina está se expondo nem um transeunte será obrigado a ver aquela cena. Entramos assim no terceiro julgamento, que é o legislador universal.

Essa situação é curiosa porque, quanto estamos envolvidos no momento, é fácil justificar tudo. Por isso Kant propôs a terceira regra, porque ela nos tira da situação. Imagine você entrando em uma rua e viesse imediatamente aquele cheiro forte de urina. Você iria dizer “Ok” ou “Nossa, que fedor”? A partir do momento em que você reclama do cheiro, você está julgando que aquilo não deveria ser daquele jeito. Logo, você está dizendo que não gostou que alguém fizesse xixi na rua, que você reprovou a ação. E, se reprovou a ação quando a julga de forma externa, sem envolvimento, também não está certo aceitá-la quando você está envolvido.

Dessa forma, no exemplo C, a ação de fazer xixi na rua seria considerada errada pela regra III. Sendo assim, considerada inadequada.

Exemplo D:

Estou na rua e uma pessoa me aborda, pedido dinheiro. Naquele momento, não tenho dinheiro sobrando, tudo me é necessário. Sou obrigado a ajudar?

Essa é uma situação muito comum e muito crítica.

Pela lei universal, não julgaríamos que todos devem dar dinheiro quando alguém pede. Se fosse assim, todo o nosso dinheiro seria dado aos outros porque o que não falta são pessoas pedindo. Se isso fosse realmente uma lei positiva (do nosso código brasileiro), teríamos um sério problema econômico porque não existia controle sobre quem pede, quando pede, tendo o risco de todos quererem virar pedintes por achar mais prático. Claro que estou exagerando aqui, mas é para passar essa ideia do que acontece se algo que não deveria ser obrigatório se tornasse obrigatório.

Da mesma forma, negar dinheiro a um pedinte também não feriria a dignidade humana. Considerando que o Estado tem programas sociais para atender pessoas em vulnerabilidade e você é um cidadão que honra com seus impostos, o pedinte pode ser atendido pelo governo, não precisando que você dê o seu dinheiro diretamente a ele. Claro que aqui deve se ter o respeito ao dizer que não pode ajudar.

Por fim, caso você passasse na rua e visse alguém pedindo dinheiro para outra pessoa, você não julgaria dizendo “aquela pessoa deve dar o seu dinheiro para a outra”. Você pode até achar nobre e louvável essa atitude, mas não uma obrigação.

Dessa forma, no exemplo D, negar uma ajuda financeira a quem lhe pede é uma ação moralmente aceita.

Imperativo Categórico Descomplicado: Conclusão

Como eu disse, os exemplos são polêmicos. Pode ser que você que está lendo discorde deles e isso é válido. A ética kantiana é uma das diversas propostas éticas que existem e não precisa ser necessariamente aquela que você escolheu para seguir. A intenção dos exemplos foi mostrar, à luz da teoria kantiana, casos em que devemos agir (nossa razão nos obrigaria) e casos que temos a opção de agir (nossa razão nos dá apenas a possibilidade).

A ética do dever, que é o nome que damos para um tipo de ética que diz como devemos ou não agir, é uma proposta restritiva, que não dá muitas margens para opção. Kant, com sua teoria, considerou ter encontrado a melhor forma de criar um sistema ético que pudesse funcionar e ser aceito por todas as pessoas. Esse sistema inspirou e ainda inspira a maioria dos ordenamentos jurídicos, porque é uma forma de criar regras impessoais, que evitam beneficiamentos de um em detrimento de outros.

E aí? Gostaria de dar outros exemplos do cotidiano e avaliá-los segundo o Imperativo Categórico de Kant? Deixa aí nos comentários! Gostou de aprender como funciona a ética para Kant? Compartilha esse artigo para que outras pessoas também possam aprender sobre o Imperativo Categórico de um jeito descomplicado! Ainda ficou alguma dúvida? Entra em contato comigo para eu poder esclarecer melhor.

Até a próxima e tenham uma boa viagem!

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Professor de filosofia desde 2014 e nerd desde sempre. Tem como objetivo pessoal mostrar às pessoas que filosofia é importante e não é uma coisa chata. Gosta de falar dos temas filosóficos de forma descontraída e atual, fazendo muitas referências ao universo nerd.