Subjetividade da Beleza Descomplicada: Estética de Locke e Hume

Subjetividade da Beleza Descomplicada: Estética de Locke e Hume

Olá, marujos! Hoje, explicaremos a noção de subjetividade da beleza contida na filosofia de John Locke e David Hume de uma forma descomplicada. Esse é um artigo da área de estética e filosofia da arte. Vamos reapresentar esses dois autores, relembrar brevemente suas teorias empiristas (que é algo fundamental para compreender a noção estética deles) e finalizar explicando a subjetividade da beleza em si. Vamos lá!

Sobre Locke e Hume

John Locke nasceu em 29 de agosto de 1632 em Wrington, Inglaterra. Seus estudos se destacam na área da teoria do conhecimento e política, sendo um dos fundadores da teoria política do liberalismo. Foi professor universitário e secretário do chanceler da Inglaterra. Chegou a se exilar devido a perseguições políticas. Ajudou a redigir o documento Declaração dos Direitos, que instituiu a monarquia constitucional no Reino Unido. Morreu em 28 de outubro de 1704.

David Hume nasceu em 7 de maio de 1711 em Edimburgo, Escócia. Seus estudos se destacam na área da teoria do conhecimento, sendo defensor de um empirismo radical e tendo um pensamento cético com relação a previsibilidade da ciência. Enquanto vivo, só ganhou destaque como historiador, devido a sua obra História da Inglaterra. Desde novo mostrou aptidão para a filosofia, mas nunca teve suas ideias reconhecidas à época, ainda sendo perseguido por ser declaradamente ateu. Morreu em 25 de agosto de 1776.

Empirismo de Locke e Hume

Para um artigo dedicado ao Empirismo de John Locke, acesse: Empirismo de John Locke Descomplicado.

Para um artigo dedicado ao Empirismo de David Hume, acesse: Empirismo de David Hume Descomplicado.

Tanto Locke quanto Hume foram grandes representantes do chamado Empirismo Inglês, uma corrente de pensamento filosófico moderno que defendia a tese de que o conhecimento se origina da experiência sensível, que a mente humana nasce vazia e que vai sendo preenchida conforme o ser humano vai tendo contato com o mundo, através dos seus sentidos.

Para Locke, o conhecimento começa com a sensação (sentir as coisas pelos nossos sentidos). Pela sensação, captamos as qualidades das coisas (as características genéricas de algo, como forma, tamanho, temperatura, sabor). Das qualidades, vêm as ideias simples (as características específicas de algo, como quadrado, redondo, pequeno, grande, quente, frio, doce, amargo). Por fim, da reunião das ideias simples, formamos em nossas mentes as ideias complexas (que são as imagens dos objetos em si, como moeda, limão, carro).

David Hume aprofundou o conhecimento de Locke e fez uma distinção entre aquilo que experimentamos de algo, o contato imediato (que ele chama de impressão), e a lembrança daquilo que experimentamos (que ele chama de ideia). Hume defenderá que um conhecimento puro é apenas a impressão, que toda a ideia já é uma deturpação daquilo que foi de fato experimentado. Ele vai dizer que toda a ciência se baseia na combinação de ideias, que é o relação de várias coisas que lembramos das experiências. Logo, ela não forneceria um conhecimento verdadeiro. Verdadeiro é apenas aquilo que experimentamos no hora, no ato. Todo o resto já é um conhecimento enfraquecido.

Subjetividade da Beleza Descomplicada: Estética de Locke

Para Locke, a beleza é subjetiva. O que isso quer dizer? Quer dizer que a beleza não é medida no objeto em si, mas no sujeito que contempla o objeto. Para ele, a beleza não é uma qualidade (uma característica) do objeto, mas um sentimento na mente do sujeito que contempla aquele objeto.

Uma escultura, por exemplo, não é bela em si, no sentido que ela possui as características necessárias para ser chamada de bela. Na verdade, ela será bela para as pessoas que sentirem prazer ao olhar a escultura, será indiferente para as pessoas que não sentirem nada ao verem a escultura e feia para quem sentir desprazer ao ver a escultura.

Locke, então, vai dizer que uma mesma obra de arte pode ser bela para uns e feias para os outros porque a beleza não está na obra de arte, mas na sensação de prazer (ou desprazer) que alguém sente ao contemplar essa obra de arte. Seria por isso que tem pessoas que gostam de um estilo musical enquanto outros detestam, por exemplo.

Essa mesma relação também pode ser considerada para a beleza de uma pessoa. Alguém que é feio para uns é bonito para outros.

Como o critério de beleza é subjetivo (está na sensação do sujeito), não existe um referencial. Logo, não existe a obra de arte perfeita, o autor ideal. Qualquer obra de arte pode agradar uns e desagradar outros, sendo ora belas ora feias.

Da mesma forma, não existe padrão de gosto para Locke. Como cada indivíduo avalia a beleza de uma obra de arte pelo prazer que ele sente ou não sente, todos os julgamentos que ele faz são verdadeiros do ponto de vista dele. Ao mesmo tempo, esses julgamentos estéticos podem ser aceitos ou não pelos outros porque a experiência estética de cada pessoa é diferente. Ou seja, aquilo que eu julgo como belo pode ser julgado como feio por outra pessoa. Existe alguém certo? Sim, os dois! Porque, como já falei, o gosto é subjetivo.

Subjetividade da Beleza Descomplicada: Estética de Hume

Assim como Hume refinou/aprofundou a noção empirista de Locke, ele também o fez no campo da estética.

Mecanismo do Gosto

Hume percebeu que a forma como adquirimos o gosto estético passa por dois estágios:

1°. Estágio perceptivo: é o momento em que percebemos as qualidades (características) do objeto artístico. É quando sentimos ele com os nossos sentidos. Fazendo uma relação com a forma como produzimos conhecimento, podemos associar esse momento à impressão da obra de arte, ou seja, aquilo que de fato estamos sentido dela (aparência, textura, odor, sabor, som etc).

2°. Estágio afetivo: é o momento em que as qualidades percebidas geram prazer ou desprazer em nós. É quando sentimos com os nossos sentimentos. Fazendo uma relação com a forma como produzimos conhecimento, podemos associar esse momento à ideia da obra de arte, ou seja, aquilo que interpretamos dela (nos fez bem, nos fez mal, causou alegria ou tristeza, nos trouxe uma boa sensação ou nos causou desconforto).

Julgamento da Beleza

Como cumprimos dois estágios para apreciar uma obra de arte, Hume concluiu que existem duas categorias para julgar a beleza de uma obra artística:

a) Julgamento Puramente Afetivo: esse tipo de julgamento é totalmente subjetivo tal como propôs Locke. Nesse caso, todas as pessoas percebem pelos sentidos as mesmas características do objeto artístico, mas podem interpretar em seus sentimentos de forma diferente: uns gostam e outros não gostam. Aqui, vale o exemplo da música: uma pessoa pode escutar uma Bossa Nova e gostar e outra pode achar chato; uma pessoa pode escutar Sertanejo e gostar e a outra pode achar chato.

b) Julgamento Perceptivo: esse tipo de julgamento ainda é subjetivo, mas possui algo de universal. Explico: nesse caso, todas as pessoas percebem pelos sentidos as mesmas características do objeto artístico e todas (ou a grande maioria) percebe que algo está errado, alguma característica não está em acordo com a percepção normal daquela característica. Exemplo: quando você escuta alguém cantando e essa pessoa é desafinada, mesmo que você goste da música ou do estilo musical, você achará ruim. Aqui, não é questão de agradar ou desagradar ao sentimento, mas uma questão de agradar ou desagradar os próprios sentidos (no exemplo, você não aguenta ouvir alguém desafinando a sua música preferida).

Podemos dizer que o julgamento perceptivo ainda é subjetivo, porque ainda é uma questão de agradar ou desagradar o sujeito (ou seja, o foco é o sujeito e não o objeto). Contudo, possui um traço de universalidade porque o funcionamento dos nossos sentidos é, em sua maior parte, igual (a maioria das pessoas veem as mesmas cores, sentem os mesmos gostos, ouvem os mesmos sons etc). Logo, existe uma certa unanimidade ao dizer se algo é belo ou feio.

Nesse sentido, podemos dizer que existe um gosto superior ao outro. Ou seja, comparando duas obras ditas artísticas, podemos avaliar se uma é mais bonita do que a outra, no sentido de que possuem mais ou menos características que agradam aos sentidos ou características que desagradam aos sentidos.

Princípios do Gosto

Hume observou que algumas obras de arte possuem uma unanimidade estética, ou seja, são admiradas ao longo das épocas e das diferentes culturas. Dessa compreensão, ele concluiu que existem algumas propriedades dos objetos artísticos que são preferidos pela percepção humana, enquanto outras propriedades não o são. Ele chama isso de princípios de gosto. No mesmo exemplo da música: existe um tom do canto que agrada universalmente os ouvidos das pessoas e outros tons aceitáveis por muitos, mas também existem alguns tons inaceitáveis para qualquer pessoa, seja ela especialista ou não no assunto.

Contudo, Hume não é ingênuo ao perceber que fatores como opinião pessoal e questões culturais podem influenciar a avaliação estética de uma pessoa. Seria o caso, por exemplo, de querermos avaliar uma escultura rudimentar feita por um índio ou querer que ele avalie o quadro da Mona Lisa. Da mesma forma, também não está certo que alguém que odeia pagode seja jurado de um concurso musical desse gênero. Novamente, vemos aqui a importância do subjetivo sobre o objetivo.

Para “resolver” essa questão, Hume diz que o mais acertado é que, na busca de um padrão de gosto, as avaliações estéticas sejam feitas por juízes capacitados para tal e em conjunto, para que seja uma avaliação coletiva.

Subjetividade da Beleza Descomplicada: Ensinando esse Conteúdo

Caso precise ensinar esse conteúdo em sala de aula e queira fazer alguma coisa diferente, recomendo a leitura do artigo: Ensinando Subjetividade da Beleza através de Jogos: Mysterium & Dixit / Detetive.

Subjetividade da Beleza Descomplicada: Conclusão

Vimos, com esse artigo, que uma das formas de compreender a beleza é que ela é subjetiva. Provavelmente, você já tinha ouvido isso, mas agora você possui um fundamento filosófico para entender e até explicar essa forma de se pensar a beleza!

E aí? Quais outros exemplos podemos dar para comprovar que a beleza é subjetiva? Deixa nos comentários! Gostou de entender a base filosófica da frase “beleza é subjetiva”? Compartilha e ajuda outras pessoas a aprenderem também. Quer que eu trabalhe os outros conceitos de beleza? Entra em contato comigo pedindo!

Atá a próxima e tenham uma boa viagem!

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Subjetividade da Beleza Descomplicada: Referências

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Filosofando: introdução à filosofia. São Paulo: Moderna, 2016.

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Professor de filosofia desde 2014 e nerd desde sempre. Tem como objetivo pessoal mostrar às pessoas que filosofia é importante e não é uma coisa chata. Gosta de falar dos temas filosóficos de forma descontraída e atual, fazendo muitas referências ao universo nerd.