Reflexão sobre Donnie Darko: Por uma Contemplação da Vida

Reflexão sobre Donnie Darko: Por uma Contemplação da Vida

Olá, marujos! Hoje, faremos uma reflexão sobre o filme Donnie Darko, um filme de ficção científica cult. Posso adiantar que esse filme é completamente metafórico, beirando ao nonsense (sem sentido). Sendo assim, a minha reflexão sobre o filme não significará a leitura correta dele, será apenas a minha leitura do filme, o que ele provocou em mim. Por isso, seria muito legal se vocês também deixassem as suas leituras do filme nos comentários. Teremos spoilers do filme durante essa reflexão, e eu recomendo muito que você tenha visto o filme antes de ler, para que a sua interpretação não seja afetada pela minha. Vamos lá!

Sobre Donnie Darko

Donnie Darko é um filme de ficção científica e horror de 2001. O filme é muito elogiado e se tornou cult. Sua história é bem “estranha”, e muita coisa não é explicada, dando brechas para muitas interpretações. No Brasil, ele está disponível na Amazon Prime Video.

Donald “Donnie” Darko (Jake Gyllenhaal) é um adolescente que possui problemas mentais (seu diagnóstico será de esquizofrenia paranoica) e constantemente sofre de sonambulismo. Ele possui um amigo imaginário chamado Frank (James Duval), que é uma pessoa em uma fantasia de coelho macabra.

Nas suas crises psicológicas, Frank conversa com Donnie e lhe diz muitas coisas e também lhe dá ordens. A primeira coisa que Frank pediu foi que Donnie saísse de casa à noite para ir ao campo de golfe. Lá, Frank disse que o mundo acabaria de 28 dias, 6 horas, 42 minutos e 12 segundos. Enquanto Donnie e Frank “conversavam”, uma turbina de aeronave caiu do céu e destruiu o quarto de Donnie. Se não fosse Frank, Donnie estaria morto.

Alguns dias depois, já na escola, chega uma garota nova na turma de Donnie chamada Gretchen Ross (Jena Malone). Imediatamente “rolou um clima” e não demorou muito para eles começarem a sair juntos.

Passaram alguns dias e Frank falou com Donnie sobre a possibilidade de viagem no tempo. Donnie começou a pesquisar mais sobre isso e conseguiu uma série de informações com seu professor de ciências, que lhe indicou um livro chamado “A Filosofia da Viagem no Tempo”. Donnie descobre que a autora do livro é, agora, uma velha maluca conhecida como Vovó Morte (Patience Cleveland).

No dia do suposto fim do mundo, Donnie vai com Gretchen e mais dois amigos à casa da Vovó Morte. Lá, ocorre um acidente e Gretchen é atropelada e morre. Quem dirigia o carro era um cara fantasiado de coelho: Frank! Donnie saca uma arma que trazia com ele (roubada dos pais) e atira em Frank, matando-o.

Após esses acontecimentos, Donnie percebe o surgimento de um buraco de minhoca (anomalia espaçotemporal) e vê uma oportunidade de viajar no tempo. Ele, então, decide voltar para o dia da queda da turbina e ficar no quarto na hora da queda. Assim, ele conseguiria mudar a linha temporal e evitar os acontecimentos que causaram a morte de Gretchen.

O plano dá certo. A turbina cai, Donnie morre, e Gretchen aparece viva, andando de bicicleta.

IMPORTANTE: Tanto esse resumo quanto a reflexão que se segue, baseiam-se no filme original. Em 2004, foi lançada uma versão do diretor que “explica” algumas coisas sobre os acontecimentos filme. Eu irei ignorar essas “explicações”, focando naquilo que eu experimentei ao ver o filme original.

Reflexão sobre Donnie Darko: Mad World

A canção final do filme, Mad World, para mim é a parte mais importante do filme. O momento em que dá “sentido” para tudo. O sentido que a música dá é que a vida como está hoje é louca e sem sentido porque as pessoas vivem uma vida muito banal e automatizada. A maioria das pessoas vivem as suas “vidinhas” pacatas, sem graças, um dia de cada vez, sem se preocuparem em ver um sentido em sua existência, na existência do mundo, o famoso “sentido da vida” e o “sentido da minha vida”.

Para piorar, as pessoas que questionam isso, que decidem ir contra o sistema, que decidem “chacoalhar as cabeças” dos outros para esses pensamentos são consideradas malucas, esquisitas, estranhas, paranoicas… Contudo, o que o filme mostra, na minha leitura, é que a loucura está exatamente no fato das pessoas NÃO quererem questionar tudo, NÃO quererem ir contra o sistema, NÃO quererem “chacoalhar as suas cabeças”.

Donnie, a todo momento, é taxado de maluco e esquisito, tanto pela sua família quanto pelos adultos “certinhos” (diretor, professora de ginástica, o coach, a psicóloga). Já os seus amigos e os adultos “transviados” (a professora de inglês e o professor de ciências) gostam do jeito de Donnie. Eu consigo compreender a angústia de Donnie porque, em certo aspecto, passo pelo que ele passou sendo professor de filosofia. É muito interessante ver como a maioria dos jovens adoram as teorias filosóficas, adoram quando aprendem teorias que fazem suas “cabeças explodirem”, sendo o que mais instiga eles na sala de aula. Por outro lado, a maioria dos adultos não liga tanto para isso, considera toda filosofia loucura, sem sentido, sem utilidade.

Dessa forma, fica a reflexão: o nosso mundo é louco porque as pessoas aceitam a sua realidade de forma muito fácil. Vivem uma vida banal, preocupadas apenas em viver um dia após o outro, no máximo com planos materiais (comprar uma casa, fazer uma faculdade, casar, ter filhos), mas sem entenderem o porquê de elas estarem vivas, o porquê de elas existirem nessa realidade nesse exato momento, o porquê de elas fazerem o que fazem.

Reflexão sobre Donnie Darko: Cellar Door

A palavra Cellar Door aparece escrita no quadro negro da sala de aula e é tema de diálogo entre Donnie e sua professora de inglês Karen Pomeroy (Drew Barrymore). É um diálogo rápido, um momento em que Karen está arrumando suas coisas porque foi demitida. Questionada por Donnie do motivo dela ter escrito aquilo, Karen diz que uma vez, um linguista famoso (provavelmente, referência a Tolkien) disse que de todas as palavras da língua inglesa, Cellar Door era a mais bonita.

De fato, Cellar Door é considerada por muitos especialistas a palavra mais bonita em sonoridade, desconsiderando o seu sentido (Cellar Door significa simplesmente “Porta da Adega”). Para o contexto do filme, vejo nisso uma crítica àqueles que querem buscar um sentido racional para tudo na vida. E, consequentemente, esquecem de viver a beleza da vida em si.

Repare que esse questionamento concorda com o que foi dito na sessão anterior desse artigo. Aqui, temos uma crítica àqueles que vivem suas vidas de forma automática e uma indicação que o sentido do viver é aproveitar o momento, aproveitar enquanto se está vivo, aproveitar os prazeres sensíveis que a vida pode nos proporcionar.

Cellar Door nos chama à contemplação do momento, na busca pelo prazer da experiência de viver. Porém, para isso acontecer, você precisa tanto estar consciente de que está vivo (ou seja, não pode estar no modo automático) quanto estar disposto a deixar as coisas fluírem (sem uma preocupação constante em ver um sentido racional em tudo o que se faz). Podemos fazer, aqui, uma associação com a contemplação estética. Esse conceito filosófico diz que, para vivermos uma experiência estética autêntica, precisamos estar presentes à obra de arte, de forma despreocupada e dispostos a sentir o que a obra quer nos dizer, sem preocupação em buscar um sentido lógico nela.

Dessa forma, fica a reflexão: será que estamos “curtindo” nossas vidas, ou estamos preocupados demais em ganhar dinheiro, cumprir metas, alcançar status sociais, obter coisas, que acabamos deixando passar os bons momentos que a vida nos proporciona?

Reflexão sobre Donnie Darko: Destruir para Reconstruir

O filme, em várias situações, mostrar algo sendo destruído e/ou reconstruído. Sempre o novo, o momento pós destruição, traz algo diferente.

O quarto de Donnie, após ser destruído pela turbina, é reconstruído e ganha móveis e um aspecto muito melhor (que é invejado por sua irmã). Após o incêndio na casa do coach Jim Cunningham (Patrick Swayze), é revelado seu envolvimento com pornografia infantil (desmascarando a sua falsa moralidade). Por fim, após a viagem no tempo e aceitação da sua própria destruição, Donnie provoca a reconstrução da vida de todas as pessoas com que ele se envolveu, em especial a vida de Gretchen.

Dessa forma, fica a reflexão: precisamos ver, nas mudanças drásticas, oportunidades. Mesmo que nem sempre a mudança drástica possa trazer coisas boas, elas podem trazer oportunidades de enxergar as coisas por outros olhos, ter uma nova visão do mundo, da sua vida. Esse “abrir os olhos” pode fazer com que você pare de viver a vida no automático, e encontre o sentido estético, prazeroso, no seu viver.

Nessa pandemia (ou durante a época da pandemia, se você estiver lendo esse artigo muito no futuro), muitas famílias reencontraram o prazer em estar juntas, em poder acordar com calma, tomar o café da manhã reunindo todos os membros e sem pressa, em poder conviver e trocar experiências, em fazer coisas juntas. Tudo isso são coisas corriqueiras que foram deixadas de lado devido ao corre-corre das vidas urbanas conturbadas. E que, agora, puderam ser retomadas.

Conclusão

Tentei apresentar três pontos de reflexão no filme Donnie Darko, em três momentos do filme que me chamaram a atenção. Nesse texto, acabei conseguindo dar uma certa lógica no encadeamento da reflexão. Mas acredito que isso é muito mais circunstancial do que mandatório. Como eu disse lá no começo, esse filme é muito metafórico e está aberto a várias interpretações. Deixo aqui as minhas e fico curioso para saber as suas!

E aí? O que acharam dessa reflexão? Deixem suas opiniões e suas leituras do filme nos comentários! Gostaram dessa reflexão? Compartilhem com seus amigos que são fãs desse filme ou que precisam vê-lo! Querem sugerir algum tema para o blog? Entrem em contato comigo.

Até a próxima e tenham uma boa viagem!

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Professor de filosofia desde 2014 e nerd desde sempre. Tem como objetivo pessoal mostrar às pessoas que filosofia é importante e não é uma coisa chata. Gosta de falar dos temas filosóficos de forma descontraída e atual, fazendo muitas referências ao universo nerd.