Olá, marujos! Hoje, explicaremos a filosofia medieval de uma forma descomplicada. Abordaremos o contexto histórico do surgimento desse período filosófico, a relação entre fé e razão, quais eram os principais temas buscados pelos filósofos dessa época e quais foram os momentos filosóficos desse período. Vamos lá!
Filosofia Medieval Descomplicada: Contexto Histórico
Oficialmente, o período filosófico conhecido como filosofia medieval existe dentro do período histórico conhecido como Idade Média. Esse intervalo de tempo vai desde o século V d.C. (com a queda do império romano) até o século XV d.C. (com a queda de Constantinopla, início das grandes navegações e invenção da impressa).
Apesar de muitos enfocarem apenas a filosofia cristã medieval, também existe um desenvolvimento filosófico islâmico e judeu nesse período.
Devido ao foco desse período filosófico geralmente recair sobre a filosofia cristã, muitos (incluindo eu), gostam de considerar o início da filosofia medieval (mesmo que de forma rudimentar) já no século I d.C., com o surgimento do cristianismo, já que todo esse período será marcado pela relação entre fé e razão.
Filosofia Medieval Descomplicada: Relação entre Fé e Razão
Curiosamente, tanto as filosofias medievais cristã, islâmica e judaica irão ter como principal preocupação filosófica a conciliação das verdades de fé (de cada religião) com as verdades produzidas pela razão. A grosso modo, podemos dizer que o objetivo da grande maioria dos filósofos medievais era fundamentar as suas respectivas fés em bases racionais ou mostrar que uma coisa não anula a outra.
Desde o começo, no cenário cristão, a relação entre filosofia e fé não foi pacífica. Por vezes, a filosofia foi vista como inimiga da fé. Em outros momentos, o cristianismo foi visto como uma doutrina filosófica alternativa às doutrinas clássicas. Por fim, acabou a filosofia servindo como auxiliar da fé cristã, mas em uma posição subalterna (quando existia uma divergência inconciliável, prevalecia a fé cristã).
No cenário islâmico e judeu, a problemática entre fé e razão também era grande, exigindo muito esforço dos filósofos na conciliação desses pensamentos ou, ao menos, na defesa da filosofia como uma forma válida de se pensar.
Filosofia Medieval Descomplicada: Principais Temas Filosóficos
Tendo isso em vista, os principais temas discutidos dentro da filosofia medieval estavam intimamente ligados a problemas teológicos, a saber:
Deus (provar racionalmente que Ele existe e explicar racionalmente quem Ele é);
Ser humano (explicar quem é o ser humano à luz da razão, mas sem ignorar o fato dele ter sido criado por um Deus todo-poderoso);
Predestinação e Livre-arbítrio (explicar se o ser humano já está predestinado ou é livre em suas ações, e como isso funcionaria ao mesmo tempo que ele é criatura de um ser onisciente – que tudo sabe);
Conhecimento humano (quais são os limites para o ser humano conhecer a verdade e se ele pode alcançá-la sozinho ou depende do auxílio divino);
O Problema dos Universais (remetendo à disputa metafísica entre Platão e Aristóteles, os filósofos queriam entender se os conceitos gerais são coisas de fato (tipo as ideias de Platão) ou apenas nomes que damos para um grupo de indivíduos que guardam mesmas semelhanças (tipo as substâncias de Aristóteles).
Filosofia Medieval Descomplicada: Filosofia Cristã
Apóstolos, Padres Apostólicos e Padres Apologistas (séculos I d.C. a III d.C.)
Como dito anteriormente, o berço da filosofia medieval cristã está no surgimento do cristianismo, tendo em vista que boa parte das discussões filosóficas medievais estão diretamente relacionadas à fé cristã e suas implicações na compreensão de todo o resto.
Com isso, os primeiros a desenvolverem um pensamento relacionamento fé e razão, buscando explicações racionais para a fé cristã, foram os padres apostólicos e os padres apologistas.
O cristianismo surgiu na Judeia, após a morte de Jesus Cristo, que se intitulava o Messias, filho de Deus. Alguns judeus que seguiam Jesus fundaram o cristianismo e começaram a pregar essa doutrina como se fosse a religião verdadeira. Até esse momento, não se fazia necessário nenhuma explicação racional da fé cristã já que a conversão era de um judeu (que já tinha a fé em um Deus único) para o cristianismo (bastando aceitar que Jesus era o filho enviado desse Deus).
Contudo, os apóstolos entenderam que o cristianismo era para todos os seres humanos e começaram a espalhar sua fé também para os pagãos, que não tinham contato com o judaísmo e tinham muito forte o pensamento racional vindo das escolas filosóficas gregas. Dessa forma, a partir de Paulo, que teve uma educação formal judaica e era cidadão romano (o que incluía uma certa cultura grega), o cristianismo foi pregado para os gentios, muitas vezes fazendo-se referência a doutrinas filosófica existentes.
Os padres apostólicos são um grupo de autores cristãos que, segundo a tradição, chegaram a ter contato direto com os apóstolos originais e deixaram vários escritos explicando a fé cristã e a importância da conversão. Muitos deles eram pagãos convertidos e, por isso, tinham como bagagem a formação clássica grega, que incluía filosofia.
Já os padres apologistas foram escritores que tiveram que defender a fé cristã de ataques externos (pagãos críticos ao cristianismo) e internos (heresias – compreensões erradas da fé dentro da igreja). Para fundamentar a considerada doutrina correta da igreja cristã, muitas teorias e termos filosóficos foram empregados, servindo como base racional para a explicação da fé cristã primitiva. Nesse período, os cristãos eram perseguidos pelos imperadores romanos.
O tipo de escrita mais comum dessa época são as cartas.
Patrística (séculos IV d.C. a VIII d.C.)
A patrística é marcada pelo estabelecimento da religião cristã como religião oficial do império romano e, posteriormente, como a religião oficial dos feudos europeus.
O termo patrística se refere aos chamados padres da igreja, os quais compõem um grupo de estudiosos que elaboraram o fundamento do que hoje chamamos de teologia.
Com a fé cristã livre de perseguições externas, os padres da igreja se concentraram exclusivamente em fundamentar a religião cristã, elaborando toda a sua doutrina. Essa doutrina foi fundamentada especialmente na filosofia neoplatônica, através de uma apropriação dos conceitos de Plotino adaptados à fé cristã.
Muitos conceitos filosóficos são usados e adaptados para explicar racionalmente algumas verdades de fé que não foram bem elucidadas ou trabalhadas nos livros bíblicos.
O principal representante desse período foi Santo Agostinho de Hipona.
O tipo de escrita mais comum dessa época são livros em primeira pessoa. A linguagem deles era mais próxima a sermões, como se fosse alguém dando uma aula / explicação sobre um assunto; ou a conversas interiores (o autor conversando consigo mesmo, tentando esclarecer os problemas teológico-filosóficos que tinha).
Escolástica (séculos IX d.C. a XV d.C.)
A filosofia escolástica hoje compreende o momento histórico medieval do surgimento e estabelecimento das escolas e universidade como principais polos de ensino e aprendizagem da doutrina filosófico-teológica da época.
Se antes, os principais teóricos eram bispos que estavam junto à comunidade cristã nas igrejas particulares, lidando com problemas do dia a dia de uma igreja; agora, é formado um grupo de estudiosos que permanecem a maior parte do tempo dedicados exclusivamente aos estudos. Por isso, boa parte dos teóricos dessa época são monges.
A grande mudança na contribuição filosófica para a teologia da época foi a utilização das obras de Aristóteles como principal fonte de fundamentação teórica (em detrimento do pensamento de Platão). Já as questões filosóficas discutidas continuaram as mesmas.
O principal representante desse período foi Santo Tomás de Aquino.
O tipo de escrita mais comum dessa época são os manuais / livros didáticos, os comentários às obras já escritas e as sumas (explicações sistemáticas de diversos assuntos). O estilo de linguagem desses livros era bem formal, pois eram estudos críticos, que apresentavam argumentos e contra-argumentos, críticas e fundamentações, pontos a favor e contra. Para os padrões de hoje, podemos dizer que eram livros escritos de forma científica e acadêmica, com uma preocupação grande no rigor da escrita e uso dos termos.
Filosofia Medieval Descomplicada: Filosofia Islâmica e Judaica
A filosofia islâmica também é conhecida como filosofia árabe. Seus pensadores, como o nome sugerem eram adeptos do islamismo. Já a filosofia judaica, como o nome sugere, são adeptos do judaísmo.
Em ambos os casos, a filosofia grega chegou para esses povos do Oriente através das conquistas territoriais feitas pela Macedônia. Alexandre, o Grande, levou a cultura grega para todos os territórios que conquistou e, com isso, difundiu o pensamento helênico, que foi recebido pelas culturas desses povos conquistados.
Basicamente, as filosofias islâmica e judaica são comentários e interpretações das obras de Platão e Aristóteles. Algumas vezes, essas obras levaram os filósofos a contradizerem as doutrinas religiosas do Islã e Judaísmo. Em outras situações, buscou-se a conciliação.
Os principais temas desses filósofos eram a metafísica (o que são as coisas), a lógica (como argumentar corretamente) e a ética (como agir corretamente).
Em certo momento histórico, tanto os judeus quanto os islâmicos saíram do Oriente Médio e foram também para a Europa. Esse trânsito foi fundamental para a troca de conhecimento deles com os filósofos cristãos e vice-versa.
Os principais filósofos medievais islâmicos são Avicena (980-1037) e Averróis (1126-1198).
O principal filósofo medieval judeu é Moisés Maimônides (1135-1204).
Filosofia Medieval Descomplicada: Livros
Para saber mais sobre o tema, recomendo os livros:
Filosofia Medieval Descomplicada: Conclusão
Ao final desse artigo, percebemos que a religião teve um impacto muito grande no pensamento filosófico medieval. Porém, uma coisa a se destacar é que a religião também foi muito impactada pela filosofia, tendo em vista que a filosofia foi utilizada para fundamentar racionalmente algo que, a princípio, deveria bastar-se pela fé. Dessa forma, vemos que boa parte daquilo que é professado nos dias de hoje nas três grandes religiões monoteístas teve grandes contribuições filosóficas, desenvolvidas especialmente na Idade Média.
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Até a próxima e tenham uma boa viagem!
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Referências
WIKIPÉDIA. Verbete Filosofia Medieval (português, alemão, sérvio), Escolástica (alemão), Filosofia Judaica e Filosofia Islâmica.