Contratualismo de Locke Descomplicado: Filosofia Política

Contratualismo de Locke Descomplicado: Filosofia Política

Olá, marujos! Hoje, explicarei o contratualismo de John Locke de um jeito descomplicado. Farei uma breve biografia do autor, explicarei o que é contratualismo, apresentarei a teoria do filósofo – desenvolvendo sua linha de pensamento, e farei um contraponto entre sua teoria contratualista e a teoria contratualista de Hobbes. Usarei linguagem simples para ajudar na compreensão. Vamos lá!

Sobre John Locke

John Locke nasceu em 29 de agosto de 1632 em Wrington, Inglaterra. Estudou em Oxford, mas não gostava do ensino tradicional escolástico.

Ele escolheu como profissão a medicina. Se tornou médico particular e, posteriormente, assessor de Anthony Ashley Cooper – o futuro conde de Shaftesbury. Isso lhe aproximou da vida política inglesa.

Locke, assim como o conde de Shaftesbury, representavam os interesses do Parlamento inglês e começaram a ter problemas com o rei Carlos II, o qual queria fortalecer o absolutismo. Esse conflito acabou no exílio tanto de Shaftesbury quanto de Locke nos Países Baixos.

Locke só retornou a Inglaterra em 1689, quando o Parlamento venceu a chamada Revolução Gloriosa, depondo Carlos II e ascendendo ao trono Guilherme de Orange. É nesse período que o filósofo publica suas obras políticas.

O filósofo assumiu alguns cargos políticos até ficar com a saúde debilitada e decidir se aposentar da vida pública. Ele morreu em 27 de outubro de 1704 em Harlow, Inglaterra.

Sobre o Conceito de Contratualismo

O conceito de contratualismo foi criado pelo filósofo Thomas Hobbes.

Basicamente, o contratualismo é uma teoria política a qual defende que a sociedade civil surgiu a partir de um contrato / pacto / acordo entre os seres humanos para viverem em uma sociedade ordenada e organizada por leis que deveriam ser cumpridas por todos.

Antes do contrato, o que existia era o estado de natureza, em que as pessoas conviviam entre si sem a existência de leis, “apenas” através da sua moralidade natural.

Contratualismo de Locke Descomplicado: Pressupostos

Objetivos Políticos de Locke

Estudando os comentadores de John Locke, pode-se compreender que eram dois os objetivos políticos de Locke ao desenvolver sua obra política Dois Tratados sobre o Governo: defender o direito à propriedade privada e defender o direito à resistência (entendida como resistência do povo a um rei tirano).

Crítica ao Poder Natural dos Reis

No seu Primeiro Tratado sobre o Governo, Locke tece uma crítica ao filósofo Robert Filmer, o qual havia lançado um livro chamado Patriarcha ou O Poder Natural dos Reis.

Nesse livro, Filmer defenderá que o poder dos reis ingleses deriva diretamente de Adão e Eva. Por sua vez, Adão e Eva teriam o poder político sobre todas as demais pessoas porque eles foram os primeiros homens, possuidores de todos as terras.

Locke discordará dessa posição, desassociando poder político de propriedade privada.

Contratualismo de Locke Descomplicado: Estado de Natureza

Primeiro Estágio do Estado de Natureza

Primeiramente, é importante destacar que Locke possui forte inspiração religiosa em sua teoria sobre o estado de natureza. Dessa forma, sua compreensão de organização humana primitiva pressupõe uma moralidade dada por Deus.

Locke dirá que, no primeiro estágio do estado de natureza, Deus criou os seres humanos em igual liberdade e direito, pois todos somos de uma mesma espécie e possuímos as mesmas faculdades mentais.

Além disso, Deus também teria nos obrigado a não fazermos mal uns aos outros e preservar toda a humanidade. Existiria uma Lei da Natureza que obrigaria todos os seres humanos a não prejudicarem a vida, saúde, liberdade e posses dos demais seres humanos, garantindo, assim, a segurança de todos.

É por isso, Locke dirá, que existiria o direito natural de punir os transgressores da lei natural. Porque essa seria uma forma de preservar a comunidade.

É também nesse estágio que se compreende o direito natural à subsistência. No caso, Deus daria o direito ao ser humano de tomar posse de toda a criação (exceto de outro ser humano, obviamente) para que, usando dela, pudesse alcançar sua subsistência.

Outra compreensão é a de direito à propriedade. A propriedade, segundo Locke, começa com a própria pessoa – somos donos de nós mesmos e ninguém pode nos obrigar a fazer nada que não queiramos. Depois, também é nossa posse tudo aquilo que produzimos com o esforço do nosso trabalho.

Pode parecer que exista uma contradição aqui, já que Locke defende ao mesmo tempo o direito comum de todos subsistirem e a propriedade privada. Porém, Locke dirá que nesse primeiro estágio do estado de natureza, ainda existia muita terra e poucas pessoas. Dessa forma, não existia conflito.

Vale destacar, entretanto, que Locke não concordava com o acúmulo e com o desperdício. Para o filósofo, em ambos os casos, o ser humano estaria tomando mais do que precisaria e isso violaria a Lei da Natureza porque esses bens acumulados e/ou desperdiçados poderiam fazer falta a alguém.

Segundo Estágio do Estado de Natureza

O segundo estágio do estado de natureza é uma evolução histórica do primeiro estágio. Nesse segundo estágio, surge o dinheiro, as trocas, o comércio e também – o mais importante –  o consentimento.

Para Locke, é através do consentimento dado entre os indivíduos iguais entre si, que se resolve aceitar dinheiro em troca de bens que possam estar excedendo. Esse seria um avanço para a humanidade porque evitaria, em um primeiro momento, o desperdício.

Depois, o comércio estimularia a produção global de bens, os quais aumentariam o que ele chama de estoque comum da espécie humana. Isso seria um grande movimento em direção à preservação da humanidade porque, quanto mais se produzisse, mais chances todos teriam de ter o necessário para subsistir.

Porém, “nem tudo são flores”…. Com o aumento das propriedades e das relações de troca entre os indivíduos, começam a surgir conflitos e controvérsias sobre os direitos individuais e coletivos dessas pessoas.

Para resolver esses problemas, os próprios indivíduos, novamente usando de suas liberdades, fazem um novo consentimento mútuo para que sejam elaboradas leis mais complexas para administrar toda essa situação.

É assim que surge a sociedade civil que conhecemos hoje em dia.

Contratualismo de Locke Descomplicado: Sociedade Civil

O governo proposto por Locke é um governo constitucional, com equilíbrio de poderes e um corpo legislativo eleito.

Ou seja, o povo participa ativamente das questões políticas ao eleger seus representantes que irão legislar em prol do bem coletivo. E, ao mesmo tempo, evita-se que alguém – como um rei absolutista – se utilize do poder que tem para tirar aquilo que é dos outros, violando o direito natural.

É por isso que a figura de um rei absolutista, que tenta possuir poderes de legislador e juiz é rechaçada por Locke. Esse rei se tornaria um tirano porque iria, nas suas atitudes, violar o direito individual das outras pessoas, mesmo que com boas intenções.

Um exemplo que o filósofo dá é a criação arbitrária de um novo imposto: mesmo que o rei queira usar esse dinheiro para um bem coletivo, como a decisão partiu apenas dele e não foi discutida no parlamento, não houve um consentimento das pessoas. Logo, ao aplicar esse imposto, estar-se-ia tirando posses de algumas pessoas sem que elas concordassem com isso. Já uma lei que cria um imposto seria correta porque aquelas pessoas que votaram e decidiram por essa lei foram escolhidas pelo povo e o representa.

Contratualismo de Locke Descomplicado: Direito à Resistência

Outro direito natural para Locke é o direito à resistência do povo contra seu rei, quando este começa a ter atitudes absolutistas – ou seja, não respeita a divisão de poderes e começa a tomar atitudes egoístas. Nas palavras de Locke, o problema começa quando a regra de conduta do governante deixa de ser a lei para ser a vontade dele.

O governante, para o filósofo, deve ser um representante da comunidade (em detrimento do pensamento tradicional, de que o governante era um representante de Deus). É por esse motivo que, mesmo mantendo a fé cristã, Locke não aceitará que o governante aja usando o argumento de estar fazendo a vontade divina.

Para Locke, ninguém está acima da lei. Logo, quando um rei age dessa forma – excedendo os limites da lei que ele deveria seguir, ele perde a sua legitimidade, seu poder e privilégios entrando em estado de guerra com o povo. Dessa forma, o povo ganha o direito de resistir ao rei, de se defender desse agressor.

É por isso que o direito à resistência seria superior a qualquer lei positiva.

Contratualismo de Locke Descomplicado: Divergências com Hobbes

Nos estudos filosóficos, quando chegamos no contratualismo, primeiro estudamos Hobbes e depois Locke. Ao comparar os dois, observamos algumas diferenças importantes:

  1. No estado de natureza de Hobbes, o ser humano é naturalmente mau, violento e egoísta; já em Locke, o ser humano é moralmente bom;
  2. O motivo do surgimento da sociedade civil em Hobbes é basicamente a criação de leis para preservação da vida do indivíduo; já em Locke, a motivação é a necessidade de leis que administrem conflitos referentes à propriedade;
  3. O governo em Hobbes é uma soberania inquestionável pelo povo; já em Locke, é um governo de representação do povo com participação dele;
  4. O contrato proposto por Hobbes é de submissão dos cidadãos a um líder; já o contrato proposto por Locke é um consentimento entre cidadãos iguais entre si.

Contratualismo de Locke Descomplicado: Conclusão

Locke escreveu um tratado político o qual expunha os problemas políticos que a Inglaterra enfrentava e também chamava o povo à ação. Seu pensamento influenciou não só as mudanças políticas da Inglaterra naquela época, mas também as mudanças na política francesa (com a Revolução Francesa) e americana (com a Guerra de Independência dos Estados Unidos). Até hoje, suas ideias estão na base das democracias liberais. 

E aí? Gostou desse artigo descomplicado sobre o contratualismo de John Locke? Compartilha! Quer um artigo descomplicado sobre outra teoria filosófica de Locke? Entra em contato comigo dizendo qual gostaria de ver aqui! Alguma parte ficou confusa ou gostaria de complementar a explicação? Comenta!

Até a próxima e tenham uma boa viagem!

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Referências

ASHCRAFT, Richard. Filosofia política de Locke. In: CHAMPPELL, Vere (org.). Locke. São Paulo: Editora Ideias & Letras, 2011 (Companions & Companions).

LOCKE, John. Dois Tratados Sobre o Governo. São Paulo: Martins Fontes, 2020.

MARTINS, Carlos Estevam; MONTEIRO, João Paulo. Locke – Vida e Obra. In: Locke. São Paulo: Abril Cultural, 1983 (Os Pensadores).

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Professor de filosofia desde 2014 e nerd desde sempre. Tem como objetivo pessoal mostrar às pessoas que filosofia é importante e não é uma coisa chata. Gosta de falar dos temas filosóficos de forma descontraída e atual, fazendo muitas referências ao universo nerd.