Reflexão sobre Borat 2: A Era das Sugar Baby e Fake News

Reflexão sobre Borat 2: A Era das Sugar Baby e Fake News

Olá, marujos! Hoje, faremos uma reflexão sobre o filme conhecido como Borat 2, que na verdade se chama Borat: Fita de Cinema Seguinte. Esse filme, que parece um documentário, mostra um ex-repórter do Cazaquistão o qual deve entregar um presente especial para o vice-presidente dos EUA como forma de criar laços diplomáticos entre os dois países. No final das contas, o filme é uma crítica ao estilo de vida americano e algumas das peculiaridades desse país. Na reflexão, focarei em dois temas tratados que se destacaram para mim: a forma como a mulher americana jovem / adolescente é sexualidade e a questão das Fake News. Teremos spoilers! Vamos lá!

Sobre o Filme

Considerações Iniciais

Tanto o primeiro filme quanto o segundo são do gênero mocumentário (falso documentário) de comédia. Alguns personagens são atores profissionais, mas a maioria das pessoas envolvidas são pessoas comuns que estavam no “lugar errado e na hora errada” ou foram enganadas porque achavam que estavam gravando para um tipo de programa e na hora que as coisas saiam de controle é que elas descobriam a verdade.

Os produtores receberam diversos processos por causa das situações humilhantes que algumas pessoas acabam sendo expostas. Alguns tiveram êxito, mas a maioria não deu em nada…

Borat 1 ou Borat – O Segundo Melhor Repórter do Glorioso País Cazaquistão Viaja à América (2006)

No primeiro filme, conhecemos Borat Margaret Sagdiyev (Sacha Baron Cohen). Ele é o segundo melhor repórter do Cazaquistão e foi incumbido de viajar para os Estados Unidos, que seria o melhor e mais desenvolvido país do mundo, e aprender a cultura americana para replicá-la no seu país de origem e, assim, torná-lo grande também.

Borat viaja junto com seu produtor Azamat Bagatov (Ken Davitian) e juntos passam por diversas situações constrangedoras nos EUA porque eles não conseguem entender a cultura americana e os valores ocidentais.

No final, depois de muitas trapalhadas, Borat volta para o Cazaquistão trazendo alguns conhecimentos aprendidos na América.

Borat 2 ou Borat: Fita de Cinema Seguinte (2020)

O filme começa com Borat dizendo que ficou preso desde a época em que chegou porque suas atitudes nos EUA causaram humilhação e vergonha para o povo e o governo do Cazaquistão. Porém, ele recebeu uma segunda chance: ele retornaria aos EUA para entregar um presente para o vice-presidente dos EUA e, com isso, garantir laços diplomáticos entre os dois países.

Borat parte para essa missão, mas tudo já começa errado: o presente (um macaco ator pornô) morre na viagem. Por isso, Borat decide dar a sua filha, que viajou escondida na gaiola do macaco, Tutar Sagdiyev (Maria Bakalova) como presente substituto.

Com isso, começa uma saga de pai e filha para transformar a menina em um modelo americano ideal de mulher jovem. Ao longo da saga, o filme vai fazendo várias críticas ao pensamento americano sobre o assunto.

Em certo momento do filme, Tutar resolve ser uma mulher livre e independente, fugindo de seu pai. Isso coincide com o início da pandemia do novo coronavírus nos EUA. Sendo um período de início de lockdown, acompanhamos também um pouco do pensamento americano sobre o assunto, enquanto Borat procura sua filha fugitiva.

No final, Borat desiste de obrigar sua filha a se casar e volta com ela para o Cazaquistão. Lá, ele descobre que era o portador do coronavírus e tudo não passava de um plano do líder cazaque de espalhar uma doença pelo mundo como forma de punição pela humilhação que ele sofreu do mundo anos atrás.

Pelo menos Borat e Tutar ficaram bem e trabalham juntos como repórteres!

Reflexão sobre Borat 2: Sugar Babies e a Questão Sexual Feminina

A maior parte do filme gira em torno do Borat tentando preparar sua filha Tutar para ser uma boa esposa atraente para o vice-presidente dos EUA.

A primeira crítica começa bem no começo, com Tutar vendo um filme sobre uma princesa chamada Melania que casa com um príncipe bem mais velho que ela e é feliz para sempre. Essa é uma representação satírica da ex-primeira dama dos EUA Melania Trump.

Já a primeira parada de Borat e sua filha nos EUA é na casa de uma Sugar Baby profissional. Sugar Baby, grosseiramente falando, é uma mulher jovem que é patrocinada por um homem bem mais velho que ela (conhecido como Sugar Daddy). Expor essa relação, que é algo bem comum nos EUA e tem se espalhado no mundo, é uma crítica ao comportamento de homens mais velhos atraírem mulheres muito jovens interessadas apenas no seu dinheiro.

Esse, na verdade, é o problema: a atração ser financeira, e não emocional. Por mais que possam argumentar diferente, o que motivou primeiramente o laço foi o dinheiro. Para alguns isso não deixa de ser uma forma disfarçada de prostituição. Mas não quero entrar nessa polêmica.

O filme também faz troça com os bailes de debutantes (que é até bem comum no Brasil). Aparentemente, o problema da festa, para o filme, é a objetificação da adolescente porque a cerimônia é a apresentação da criança pelo pai. É quase um “olha aqui como minha filha cresceu e agora é mulher”. Se olharmos com cuidado, a festa pode ser entendida como muito mais importante para o pai do que para a filha.

Também existe uma piada com aqueles que são contra a legalização do aborto. Borat vai em uma clínica da mulher e, por causa de um mal-entendido, deixa a entender que Tutar está grávida e quer tirar a criança. A pessoa que os recebe, que parece ser um médico cristão e/ou pastor diz que não é certo fazer um aborto porque a gravidez é a vontade de Deus. Só que Borat deixa a entender que foi ele quem engravidou a filha e o médico/pastor fica sem reação porque, por mais que ele abomine a forma como a gravidez se deu, ele também não pode se contradizer e aceitar o aborto agora. O constrangimento é enorme e lança luz sobre se o procedimento é válido ou não, e se uma mulher realmente deve passar por uma gravidez indesejada.

Existe muita crítica ao padrão estético feminino. Primeiro, a menina pinta seu cabelo escuro de loiro para ficar supostamente mais atraente. Também existe uma referência à depilação total dos pelos que, para alguns, evoca uma espécie de pedofilia já que naturalmente apenas crianças não possuem pelos (novamente, deixo a questão em aberto para evitar problemas…). No fim, existe toda uma aventura para que Tutar coloque silicone e tenha seios fartos porque seria isso que os homens gostam (mesmo sendo algo artificial).

O filme também não perdoa as próprias mulheres, fazendo uma crítica às mulheres conservadoras. Na cena, Tutar descobre a maravilha da masturbação feminina e incentiva as senhoras a também experimentarem isso! Óbvio que não acabou bem. Temos aqui uma crítica à repressão sexual que as mulheres sofrem pelas próprias mulheres, muitas vezes suas mães, que as desincentivam a conhecerem desde cedo o próprio corpo e o prazer sexual.

Reflexão sobre Borat 2: Fake News e a Era da Pós-verdade

Não sei se foi premeditado ou não, mas o terço final do filme ocorre durante o início da pandemia do novo coronavírus nos EUA (acredito que entre fevereiro e abril de 2020). Com isso, o “documentário” também é afetado e, durante uma semana, Borat fica na casa de dois homens em lockdown.

Durante esse período, percebemos que as ideias daqueles homens destoam um pouco da realidade… são críticas ao ex-presidente Obama sem fundamentação, são acusações que o “vírus chinês” foi espalhado propositalmente no mundo, dentre outras coisas. Se isso não fosse suficiente, Borat e esses homens vão em uma manifestação anti-confinamento em que pessoas se reuniam sem máscara para protestar contra as medidas de isolamento e fazerem acusações sem fundamento sobre toda a questão epidemiológica. Também testemunhamos a entrevista de um aliado forte de Donald Trump que faz declarações falsas sobre a origem da pandemia.

Além disso, um pouco antes na história, também existiu uma piada sobre postagens no Facebook dizendo que o holocausto nunca existiu. Tutar tinha um livro o qual dizia que a vagina possui dentes que engolem a mulher se ela se tocar… ela também diz para sua babá que aprendeu que a Terra é plana…

Todos esses exemplos trabalham a questão da Fake News. E porque notícia falsa? Porque as pessoas ficam recebendo essas informações como se fossem notícias confiáveis e as compartilham sem antes conferirem suas veracidades ou fontes.

As redes sociais (como Facebook e Twitter) e aplicativos de comunicação (como WhatsApp) se tornaram meios rápidos para que essas falsas notícias se espalhassem porque o compartilhamento é simples, quase instantâneo. Além disso, com a Internet, qualquer um pode escrever praticamente qualquer coisa. Se antes éramos limitados por um pequeno número de centrais de notícias; hoje, qualquer um pode ter o seu portal de conteúdos.

O problema não é a democratização da informação na Internet. O problema é a falta de curadoria do conteúdo. Antes, teoricamente, a informação passava por um crivo, por uma equipe de profissionais que só compartilhavam aquilo que era verdade. Hoje, não existe mais esse intermediário e as pessoas que estão na ponta, o cidadão comum, não aprendeu ou não tem interesse em fazer essa triagem.

A consequência é a divulgação de várias informações falsas, seja por maldade de uns ou ignorância de outros. Ninguém quer ter a paciência de verificar se aquilo que está lendo tem confiabilidade. É muito mais fácil compartilhar e jogar para o próximo a responsabilidade. E assim vai sucessivamente. O problema é que geralmente se recebe uma dessas notícias de alguém conhecido. Aí a pessoa pensa: “se fulano me mandou, deve ter verificado antes” ou “eu confio em fulano, se ele mandou deve ser verdade”. E assim a fake news vai se espalhando até se tornar “verdade”.

Com isso, vivemos a chamada era da pós-verdade. Esse é um conceito recente, um neologismo que ganhou força em 2016 no cenário político. Porém, hoje, pode ser aplicado a outras situações fora desse cenário.

Basicamente, dizer que estamos na era da pós-verdade é dizer que opiniões e emoções possuem mais valor de verdade do que fatos, invertendo toda a lógica racional estabelecida pela filosofia e pela ciência. Ou seja, se em determinado assunto eu já tenho a minha opinião formada por meio de uma crença não fundamentada, eu irei sustentá-la a qualquer custo, mesmo que apareçam argumentos fundamentados que me provem que estou errado. É a teimosia levada às últimas consequências…

Para piorar, muitos começam a fabricar falsas provas ou buscar falsas evidências para justificar suas crenças. Agora, primeiro eu tenho a certeza e depois busco “evidências”. E não o contrário que deveria ser primeiro a evidência e depois eu crio minha certeza sobre o assunto.

Existe manipulação midiática? Existe! Existem meias-verdades transmitidas por grandes redes de comunicação? Existe! Mas para combater isso é preciso encontrar uma outra fonte confiável, que tenha credibilidade. Não dá para apenas “cismar” que aquela mídia é corrupta ou comprada e ignorar tudo o que ela fala ou, pior, considerar que a verdade é sempre o oposto do que ela fala. Isso só vai levar a mais desinformação.

Reflexão sobre Borat 2: Conclusão

No final dessa reflexão sobre Borat 2, percebemos que ele é um filme polêmico no seu estilo de passar a mensagem. Porém, esse estilo irreverente escancara diversos problemas que não se limitam aos EUA. Por isso, mesmo que possamos desaprovar a forma como ele é feito, não podemos desconsiderar o resultado obtido: de que nossa sociedade, por mais evoluída que possa parecer, ainda precisa melhorar MUITO!

E aí? Gostou dessa reflexão sobre Borat 2? Compartilha! Quer uma reflexão sobre outros filmes que tenham esse humor negro e ácido? Entra em contato comigo dizendo qual gostaria de ver aqui! Tem outro tema de Borat 2 que lhe chamou atenção? Comenta!

Até a próxima e tenham uma boa viagem!

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Professor de filosofia desde 2014 e nerd desde sempre. Tem como objetivo pessoal mostrar às pessoas que filosofia é importante e não é uma coisa chata. Gosta de falar dos temas filosóficos de forma descontraída e atual, fazendo muitas referências ao universo nerd.