Olá, marujos! Hoje explicaremos o conceito de anarquismo de um jeito descomplicado. Como essa é uma corrente muito grande de pensamento, iremos focar em dois autores: Proudhon, que foi a primeira pessoa a se declarar anarquista e que lançou as bases desse pensamento; e Bakunin, que refinou a teoria anarquista de Proudhon, lançando luz sobre outros aspectos dessa teoria política. Esse artigo não pretende encerrar todo o conhecimento sobre esse tema, mas servirá de base para você entender satisfatoriamente esse assunto e poder aprofundar, caso queira, em outros autores e outras vertentes. Vamos lá!
Sobre Proudhon
Pierre-Joseph Proudhon nasceu em 15 de janeiro de 1809 na comuna de Besançon, na França. De família pobre, ajudava os pais na taverna que tinham. Aprendeu a ler cedo, com a ajuda da mãe. Só foi para a escola já maior, graças a um bolsa de estudos parcial. Passou por humilhação dos seus colegas porque não tinha dinheiro.
Em 1827, Proudhon começou a trabalhar em uma tipografia (a gráfica da época). Nesse trabalho, conheceu Charles Fourier, que queria publicar um livro nesse estabelecimento. Durante o processo de concepção gráfica do livro, Proudhon pôde conversar com Fourier e conhecer mais seu pensamento social e político. Esse conhecimento influenciou o pensamento de Proudhon e lhe deu um direcionamento formativo.
Ele estudou filosofia (através de bolsas de estudo e auxílio de amigos) e publicou diversos livros em que critica a propriedade privada e defende o anarquismo. Ele chegou a conhecer Karl Marx e Mikhail Bakunin. Proudhon participou de diversos atos políticos, chegando a ser preso e, posteriormente, optou pelo exílio temporário para sua segurança.
Ele morreu em 19 de janeiro de 1865 em Paris, França.
Sobre Bakunin
Mikhail Bakunin nasceu em 18 de maio de 1814 na cidade de Premukhimo, na Rússia. Era de família nobre, e teve uma educação formal quando criança. Seu pai defendia o liberalismo, mas depois adotou um postura aristocrática, defendendo o czarismo.
A vontade de Alexander Bakunin, pai de Mikhail, era que este fosse um grande oficial de carreira militar. Por isso, Alexander mandou o filho para a escola militar. Mikhail se formou e prestou serviço por um tempo, mas não gostava da profissão. Abandonou a carreira quando teve oportunidade e isso criou um problema com o pai.
Em 1835, Mikhail Bakunin foi para Moscou estudar filosofia. Lá, se envolveu em grupos de estudo dos filósofos alemãs. Mikhail foi responsável por muitas das traduções da filosofia alemã para o russo. Em 1840, Mikhail foi para Berlim com a intenção de ser professor universitário. Acabou se envolvendo com a chamada esquerda hegeliana e se aproximando dos movimentos socialistas. Abandonou a busca pelo magistério e se envolveu completamente com a luta pela revolução.
Envolvido como um dos líderes em diversos movimentos revolucionários nas regiões próximas à Rússia, foi preso em 1850 e posteriormente deportado. Trancafiado e maltratado por sete anos, conseguiu ter sua pena transformada em exílio permanente na cidade de Tomsk, na Sibéria Ocidental. Conseguiu fugir do seu exílio embarcando em um navio que ia para o Japão.
Desde então, Bakunin continuou atuando em diversos movimentos revolucionários pela Europa. Ele conheceu Proudhon, com quem compartilhava ideias próximas e Marx, com quem acabou se desentendendo por pensamentos divergentes nas estratégias contra o capitalismo.
Ele morreu em 1 de julho de 1876 em Berna, na Suíça.
Anarquismo Descomplicado: Entendendo o Termo
O termo anarquia vem das prefixo an (negação) e da palavra arkhía (governo, autoridade). Assim, percebemos que anarquia é uma situação em que não existe governo. Anarquismo, por sua vez, é um movimento político que defende um política em que não existe um governo centralizador, ou seja, a figura do Estado como órgão público que dita as regras de convivência para os seus cidadãos.
A palavra surgiu com sentido pejorativo, e foi difundida na época da Revolução Francesa por Robespierre para criticar grupos de oposição. Ela só tomou um caráter positivo com Proudhon, que desenvolveu um filosofia defendendo o anarquismo.
Posteriormente, devido aos vários movimentos revolucionários anarquistas, que entravam em conflitos violentos com as autoridades, chegando às vezes a praticarem atos hoje considerados terroristas, o anarquismo voltou a ser visto como algo negativo. Quem vê hoje essa palavra pensa em caos e bagunça, acreditando que os defensores do anarquismo querem apenas criar confusão, como se os anarquistas quisessem que cada um fizesse o que bem entendesse, criando uma desordem generalizada.
Na verdade, os anarquistas acreditam que sua proposta política trazem uma ordem, mas não uma ordem de cima para baixo (ou seja, uma ordem em que as pessoas se sentem obrigadas a obedecer uma lei imposta por um governo), e sim de baixo para cima (ou seja, uma ordem em que todas as pessoas decidem os caminhos que querem trilhar para alcançar o bem-comum).
A famoso símbolo do anarquismo, a letra A dentro de um círculo (veja a imagem da capa desse artigo) na verdade é um A dentro de um O, inspirado nas palavras “Anarquia é Ordem” de Proudhon no seu livro Confissões de um Revolucionário.
Anarquismo Descomplicado: Crítica à Propriedade
Todo o pensamento anarquista começa com a crítica à propriedade privada. Essa crítica não é novidade, já estando presente em Rousseau e também era defendida por Marx. A grande novidade trazida por Proudhon é que o Estado também não deveria ter a posse da propriedade. Enquanto que os outros teóricos tiravam a propriedade da mão dos cidadão e a colocava na mão do Estado, que iria administrar melhor, Proudhon acreditava que o Estado também iria usurpar o direito das pessoas de usarem livremente a terra.
Para Proudhon, o Estado sempre seria governado por um grupo, seja ele a burguesia seja o proletariado. E esse grupo sempre usaria o mecanismo estatal para ter seus interesses atendidos. Seria o famoso “O poder corrompe”. Logo, não deveria existir propriedade em nenhuma hipótese. Proudhon afirmava que o trabalhador tem a posse daquilo que produz, mas não do lugar que ele usou para produzir.
Proudhon chamava de mutualismo o sistema econômico que defendia. Nesse sistema, as pessoas não seriam obrigadas a trabalhar para o Estado, mas teriam liberdade de trabalharem e produzirem o que quisessem; e trocariam suas produções no livre mercado, em que cada um receberia proporcionalmente ao que produziu. Para intermediar as transações, existia o chamado Banco do Povo, que garantia justiça nas trocas e as necessidades básicas de quem estivesse em dificuldade.
Anarquismo Descomplicado: Valorização da Liberdade
Para Bakunin, a liberdade não é uma característica inata do ser humano. Os seres humanos tornam-se livres a partir das suas relações com outros seres humanos. Logo, não faz sentido que alguém se sinta livre ao ter que obedecer uma série de leis que lhes são impostas.
A liberdade, segundo o filósofo, é conquistada no cotidiano, com a convivência, quando as pessoas de livre e espontânea vontade se acertam no modo como decidem agir. Para ele, não se pode pensar em limite para a liberdade. A liberdade, assim, seria uma construção coletiva, em que todos participam ativamente das decisões a serem tomadas pelo grupo, respeitando os demais e sendo respeitados nas suas escolhas.
Para Bakunin, as relações sociais nada mais são do que um jogo de liberdades. Qualquer dominação de um grupo sobre o outro estraga essa liberdade e, consequentemente, as relações sociais estabelecidas. Nesse caso, a presença do Estado nada mais é do que a legitimação da dominação de um grupo sobre o outro, independentemente se quem está no poder é a burguesia ou o proletariado, a minoria ou a maioria.
Anarquismo Descomplicado: Organização Política
É inspirado nessas visões anteriores que se pode entender a organização política do anarquismo: não é um “oba-oba” em que todos fazem de tudo e qualquer coisa, é uma ordem construída a partir da relações entre as pessoas, sem imposições, mas com acordos. As pessoas aprenderiam a viver e se organizar. Tanto é que a revolução defendida por Bakunin não é a revolução do proletariado (que é uma parcela da população), mas a revolução do povo (que seria a totalidade da população). Dessa forma, Bakunin acredita que a mudança deve partir da totalidade e não ser imposta por um grupo (seja ela minoria ou maioria).
Tanto Proudhon quanto Bakunin propuseram estratégias para organizar politicamente as pessoas em uma sociedade anarquista. Os detalhes de cada um não cabem aqui, mas é importante entender a importância da descentralização do poder. Enquanto que um Estado concentra o poder de fazer e não fazer, sendo as decisões de cima para baixo; as decisões tomadas em uma sociedade anarquista são de baixo para cima.
Ambos os filósofos valorizavam a criação de pequenos grupos, seja de trabalhadores ou de populares para pensarem e decidirem propostas de melhorias das suas condições de vida. A política ocorreria nesses pequenos grupos, em que todos teriam voz para debater os assuntos coletivos. Quando fosse uma questão mais ampla, que envolvessem outros grupos ou outros locais, seriam escolhidos líderes que levariam as decisões do grupo para serem apresentadas e discutidas nos grupos maiores.
Vamos criar um exemplo fictício aqui:
Imagine que a minha rua não é asfaltada. Nesse caso, eu não teoria que esperar a prefeitura se mexer para fazer o asfalto. Eu iria reunir os moradores daquela rua e juntos decidiríamos como proceder, pensando em todos os trabalhos e custos necessários para colocar o asfalto (lembrem que não tem governo central, logo não tem arrecadação de impostos).
Agora, se a demanda da minha rua fosse, por exemplo, sistema de esgoto, isso envolveria outros bairros, porque teríamos que ver a construção de uma estação de tratamento em algum lugar, pensar a malha de canos para levar os dejetos etc. Nesse caso, as pessoas poderiam se reunir em bairros ou sub-bairros para traçar uma estratégia. Dessas reuniões, seriam escolhidos líderes para se reunirem e traçarem o plano final, que seria implementado.
E assim sucessivamente. Dá trabalho? Um pouco. Mas isso garantiria que a sua voz fosse de fato ouvida!
Anarquismo Descomplicado: Oposições ao Socialismo de Marx e Engels
Para relembrar a teoria socialista de Marx e Engels, você pode ler um resumo aqui.
Marx, Engels, Proudhon e Bakunin concordavam em suas críticas ao Capital, ao capitalismo e ao uso do Estado como forma de opressão da classe dominante sobre a classe dominada. Contudo, eles discordavam em alguns aspectos:
Marx e Engels defendiam a revolução do proletariado (uma luta armada que partisse dos trabalhadores). Proudhon defendia uma transformação pacífica da sociedade, sem revoltas nem guerras (por isso foi chamado de socialista utópico por Marx) e Bakunin defendia uma revolução armada, mas do povo.
Marx e Engels defendiam a ditadura do proletariado, ou seja, defendiam que os trabalhadores assumissem temporariamente o poder do Estado e confiscassem as propriedades privadas. Proudhon e Bakunin eram contra qualquer tipo de Estado, porque ele iria perpetuar o domínio de um grupo sobre o outro.
Marx e Engels defendiam que as pessoas deveriam trabalhar para o Estado e receberiam aquilo que precisavam (independentemente do esforço empregado). Proudhon defendia que cada um deveria receber conforme o seu trabalho e a negociação da produção seria livre entre os grupos de trabalhadores.
Anarquismo Descomplicado: Conclusão
Espero, ao final desse artigo Anarquismo Descomplicado, que você possa compreender que o anarquismo é um proposta política séria, que tem uma base filosófica muito bem estruturada. Se, atualmente, aqueles que defendem essa corrente não agem da forma esperada, a culpa não é da teoria dos ideólogos, mas da prática dos seguidores (mesmo problema que acontece com Marx e Engels).
Lista de Leitura (Aprofundamento em Proudhon, Bakunin e Anarquismo)
Caso queiram aprofundar seus estudos em Proudhon, Bakunin e Anarquismo, segue uma sugestão de lista de leitura:
O Que é Propriedade? (Pierre-Joseph Proudhon)
Textos anarquistas (Mikhail Alexandrovich Bakunin)
E aí? Quais são suas impressões sobre o anarquismo agora? Deixa nos comentários! Gostou de aprender sobre o anarquismo? Compartilha esse artigo e divulga para seus amigos! Quer sugerir outros temas para o blog? Entra em contato comigo!
Até a próxima e tenham uma boa viagem!
———————————————————————————————
Referências
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Filosofando: introdução à filosofia. São Paulo: Moderna, 2016.
GALLO, Sílvio. Filosofia: experiência do pensamento. 2. ed. São Paulo: Scipione, 2016.