O Tempo em Santo Agostinho Descomplicado

O Tempo em Santo Agostinho Descomplicado

Olá, marujos! Hoje, explicaremos o conceito de tempo em Santo Agostinho de um jeito descomplicado. Esse filósofo precisou entender o que era o tempo para responder à inquietante pergunta: “O que Deus fazia antes de criar as coisas”? Para responder essa pergunta, ele desenvolveu uma filosofia sobre o que seria o tempo, distinguindo-o em tempo astronômico, metafísico e psicológico. Explicarei de forma descomplicada cada uma dessas distinções, assim como farei uma breve apresentação do filósofo. Vamos lá!

Sobre Santo Agostinho

Nascido Aurelius Augustinus em 354 d.C. na atual Souk Ahras (Argélia), era um cidadão romano pagão de classe média alta.

Durante sua formação, teve contato com a filosofia, mas a utilizou mais para conhecimento próprio e fonte de respostas para os seus dilemas existenciais. Seu principal ofício foi ser professor de retórica (a arte de argumentar).

Sua via mudou em 386 d.C., quando se converteu ao cristianismo e decidiu abandonar a vida secular para se tornar monge. Porém, foi chamado pela Igreja para ser padre e depois bispo da cidade de Hipona.

Durante seu pastoreio, ele escreveu diversos livros e sermões que serviam para combater heresias internas da Igreja cristã e também auxiliar os fiéis a compreenderem algumas questões teológico-filosóficas sobre vários aspectos da vida.

Para saber mais da vida de Santo Agostinho, recomendo: Santo Agostinho Descomplicado: Biografia e Filosofia.

O Tempo em Santo Agostinho Descomplicado: Contexto e noção de Eternidade

Como apresentado na introdução desse artigo, Agostinho tentou responder uma das grandes dúvidas dos fieis cristãos: o que Deus fazia antes de criar as coisas?

A essa pergunta, as duas principais respostas encontradas pelo santo foram: “nada” e “não sei”. E o motivo dessas respostas é simples: o tempo é uma criação de Deus.

Sendo assim, não existia tempo antes de Deus criar o próprio tempo. E mais: a própria pergunta inicial se torna impossível de resposta porque a pergunta pelo que Deus fazia ANTES de criar as coisas já pressupõe a noção de tempo (“antes” é um advérbio de tempo). Dessa forma, não existe um “antes da criação do tempo” porque a noção de “antes” só aparece depois que o tempo é criado.

Mas em que “tempo” Deus vive? Agostinho dirá que é na Eternidade.

A eternidade não é um tempo infinito. Da mesma forma, o tempo não é uma infinidade finita. Tempo e Eternidade seriam duas coisas distintas.

Contudo, como só podemos pensar as coisas com a razão humana (nunca com a razão divina), a única forma de tentar compreender o que seria a eternidade seria dizer que ela é uma espécie de presente permanente. Na eternidade, as coisas simplesmente são e nunca deixam de ser ou mudam.

Lembremos que Deus é um ser perfeito. Logo, se existe perfeição não se tem o que mudar, nem para melhor nem para pior. Já se está acabado. Por isso, Deus simplesmente é na eternidade.

Um dia, as almas poderão viver essa eternidade quando, ao morrerem, saírem do controle do tempo e irem para a morada eterna junto com Deus.

Da mesma forma, Santo Agostinho também defenderá que o tempo, assim como teve um início, também terá um fim. Esse será o fim dos tempos, quando Jesus voltar para julgar toda a Terra. Nesse momento, o tempo acabará e todas as coisas que permanecerem, permanecerão na eternidade não mais mudando.

O Tempo em Santo Agostinho Descomplicado: O Tempo Astrológico

Para Agostinho, o tempo astrológico não existe. O que isso quer dizer: quer dizer que não faz sentido definir o tempo como sendo o movimento dos astros, tais como o sol ou a lua.

Para o filósofo, se a lua ou o sol deixassem de existir, ainda assim as pessoas perceberiam a passagem do tempo.

Logo, o sol e a lua só servem como referências artificiais que escolhemos para calcular a passagem do tempo, sendo que eles mesmos não são o tempo nem controlam o tempo.

Ao contrário, os astros estão sob o efeito do tempo. Tanto é que algumas pesquisas científicas conseguem dizer que o nosso sol possui 4,6 bilhões de anos e prever que ele irá deixar de existir daqui a uns 10 bilhões de ano. Vimos, com isso, que o sol é “menor” que o tempo. Se ele é inferior ao tempo, não pode ser ele aquilo que controla o tempo ou definir o que é o tempo.

O Tempo em Santo Agostinho Descomplicado: O Tempo Metafísico

Explicar o que é o tempo metafísico em Santo Agostinho é buscar explicar o que é a criatura Tempo. Pois, como falado anteriormente, Deus criou o tempo. Logo, o tempo existe, ele é algo.

Segundo o bispo de Hipona, tempo é mudança, sendo caracterizado pela sucessão de movimentos estáveis.

Para o filósofo, esses movimentos estáveis possuem como referencial o presente. Ou seja, percebemos a sucessão de movimento porque sentimos que algo “passou” pelo nosso presente.

Com isso, a grande descoberta de Agostinho é que sob o prisma ontológico (ou seja, o que é o tempo em si mesmo) só existe o presente, o “aqui e agora” e esse presente é um contínuo indivisível.

O tempo não pode ser divido porque a noção de divisão exige a existência de espacialidade. Dividimos coisas que existem no espaço, como um bolo, por exemplo. O tempo não existe no espaço, ele não faz parte das coisas espaciais. Logo, ou ele é ou ele não é.

O ser do tempo é um presente contínuo que não se divide porque o tempo simplesmente é. Aquilo que chamamos de futuro ainda não é, logo é um “não-ser” (não existe ainda). Da mesma forma, o passado é um “não-ser” (não existe mais). Só existe o presente, e esse presente não pode ser medido, mensurado ou quantificado.

Para ilustrar isso de forma anedótica, eu lembro de uma piada do “Nós na fita” em que os dois amigos percebem que usamos o tempo para medir o espaço (podemos dizer que algum lugar fica a uns 10 minutos daqui), mas não conseguimos usar o espaço para medir o tempo (não faz sentido dizer que encontrarei alguém daqui a uns 2 quilômetros)!

Enfim, o que é o tempo? O tempo é o presente acontecendo continuamente, sem antes ou depois.

O Tempo em Santo Agostinho Descomplicado: O Tempo Psicológico

Podemos dizer que compreendemos que o ser do tempo é o presente, mas não podemos negar que temos a noção de passado e de futuro. Como explicar a nossa compreensão do passado e do futuro se ambos não existem? E mais: como explicar nossa capacidade de medir o tempo se o ser do tempo não é mensurável? Para isso, Santo Agostinho desenvolverá sua compreensão de tempo psicológico.

O tempo psicológico é a compreensão do tempo pelo lado humano. Para o santo, apenas a alma humana é capaz de medir o tempo. Ou seja, apenas nós, seres humanos, somos capazes de sentir, em nossas consciências, que existe uma passagem de tempo e, com isso, tentar medir a sua sucessão contínua.

Ao fazer isso, nós acabamos dando uma pseudo-espacialização ao tempo, criando artificialmente uma divisão dele em presente, passado e futuro. Sendo assim, presente, passado e futuro são noções que só existem na mente humana!

Como Santo Agostinho já tinha definido que apenas o presente existe, ele dirá que o tempo psicológico pode ser compreendido através de um tríplice presente:

a) O presente das coisas presentes: esse tempo é o aqui e o agora, o que estamos vivendo nesse exato momento;

b) O presente das coisas passadas: esse tempo nada mais é do que o fato de estarmos no presente pensando nas coisas que já ocorreram devido a nossa memória. O passado nada mais é do que a gente, no presente, lembrando do que já ocorreu (e que não existe mais).

c) O presente das coisas futuras: esse tempo nada mais é do que o fato de estarmos no presente pensando nas coisas que poderão vir a acontecer devido a nossa capacidade de criar expectativa. O futuro nada mais é do que a gente, no presente, esperando o que poderá ocorrer (e que ainda não existe).

Como podem observar pela descrição do que seria o passado e o futuro, ambos só existem na nossa mente / alma / espírito e estão necessariamente atrelados ao presente. Porque sempre que medimos o tempo, medimos pensando no antes e no depois. Antes e depois de quê? Do presente! 

Sendo assim, é inadequado dizer que existem três tempos (passado, presente e futuro) de modo ontológico, pois só existe o presente. Porém, é possível falar linguisticamente de três tempos, quando se compreende que dois desses tempos (passado e futuro) não existem fora da mente humana (ou seja, são psicológicos), sendo apenas nomes dados para se referir ao que já foi (e não existe mais, mas ficou em nossa memória) e o que pode vir a ser (e não existe ainda, mas está na nossa expectativa).

O Tempo em Santo Agostinho Descomplicado: Conclusão

Santo Agostinho, através de uma pergunta teológica conseguiu desenvolver uma interessante reflexão filosófica sobre o que é o tempo e como o sentimos. O tempo sempre foi e continua sendo um grande mistério para todas as áreas do conhecimento. Pode ser que o único que consiga compreendê-lo de fato seja Aquele que o criou…

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Até a próxima tenham uma boa viagem!

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Referências

CARDOSO, Giovani F. Tempo e Eternidade em Santo Agostinho. Revista Filogênese, Marília, Vol. 3, nº 1, p. 81 a 91, 2010.

RODRIGUES, Marlon L. Síntese do tempo e o tempo em Santo AgostinhoMultitemas, Campo Grande, nº 22, p. 87 a 103, 2001. 

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Professor de filosofia desde 2014 e nerd desde sempre. Tem como objetivo pessoal mostrar às pessoas que filosofia é importante e não é uma coisa chata. Gosta de falar dos temas filosóficos de forma descontraída e atual, fazendo muitas referências ao universo nerd.